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Tiro pela culatra

Cabo, a mando de capitão, vai a CPI e tenta recriar Riocentro

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Autor/Imagem:
João Zisman e José Seabra

Há um jogo pesado na CPI da Pandemia. Novos atores jogam lenha na fogueira. Mas existe um que parece ter chegado ao Senado a bordo de um Puma, licenciado pelo Palácio do Planalto. É o PM Luiz Paulo Dominguetti, que se diz representante no Brasil da Davati Medical Supply. Foi ele que, supostamente em nome dessa empresa, ofereceu 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca ao Ministério da Saúde. O negócio não rendeu, afirma o policial militar, porque exigiram propina equivalente a 1 dólar por frasco comprado.

Os holofotes da opinião pública se voltam cada vez mais para a CPI da Covid. Não poderia ser diferente, mesmo para aqueles que julgam o Colegiado como uma encenação onde vilões e mocinhos se alternam no protagonismo de momentos constrangedores. Mas Dominguetti acionou a ignição do Puma. Há quem veja nisso tudo uma armação como a do Riocentro, que completa agora 40 anos. Se a estratégia for mesmo essa, a bomba está no colo do presidente Jair Bolsonaro. E se explodir, os estilhaços atingirão muita gente.

À morte de 520 mil 095 brasileiros, número macabro atingido nesta quinta, 1 de julho, soma-se a cruel e desumana roubalheira. Não importam os motivos, nem o caráter dos denunciantes. O que vale é saber se a denúncia procede e que os elementos que a comprovem estejam preservados. O resto fica por conta da incompetência da União. Essa é a certeza que fica.

Por mais que um grupo deseje, não adianta jogar fumaça para esconder a materialidade do roubo ou da tentativa do roubo. A segunda hipótese é a que melhor se adequa às negociações da Covaxin. A compra foi acertada, mas abortada após os desdobramentos da explosiva denúncia dos irmãos Luis (deputad0) e Luis Ricardo (servidor público concursado) Miranda.

Importante lembrar que a denúncia feita diretamente ao presidente da República não teve a devida acolhida pela autoridade máxima do país. A serem verdadeiras as palavras do deputado Miranda – e até aqui não há porque duvidar dele -, Bolsonaro prevaricou. O Palácio do Planalto de tudo fez para imputar crimes aos denunciantes. Teve direito a ameaças públicas a cargo de Ônix Lorenzoni, que atropelou a Lei e o bom senso ao tentar coagir um deputado federal e um servidor público, testemunhas-chave de mais um lamaçal que pode afundar muita gente – inclusive o próprio governo.

Lorenzoni, com suas declarações atabalhoadas e na pressa de defender o chefe, materializou em seu picadeiro o que se chama de voluntarioso idiota. Vem a ser, no ditado popular, aquele que escuta o galo cantar, mas não sabe onde. É o tipo de aloprado que acelera o carro sem freios em uma curva. No afã de aparecer, o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República queimou a língua. Foi obrigado a recolher-se. Não se diria que está envergonhado, pois fez o papel de quem não tem vergonha na cara.

Ao contrário de Ônix, reaparecem outros atores, como a figura vulgar do rechonchudo lobista Silvio Assis. Este volta da escuridão do ostracismo para servir de coadjuvante de uma transação inescrupulosa. Acostumado a oferecer regabofes suntuosos, regados a vinhos caros e mulheres disponíveis, Assis, que transita livremente entre o grupo de Ciro Nogueira, presidente do PP (partido, aliás, do vitimizado Ricardo Barros) reúne em torno de si aqueles que entoam o mantra da máxima da Lei de Gérson. A verdade é que, pelo conjunto de sua “obra”, qualquer menção de seu nome, por menor que seja, já é suficiente para gerar, no mínimo, suspeição.

Dominguetti é outra figura dantesca. Seu depoimento na CPI foi uma vergonha. Apesar de articulado com as palavras, o policial militar não conseguiu convencer ninguém. Pareceu estar a serviço de alguns poucos voluntariosos idiotas, que teimam em impor uma narrativa fantasiosa em que os “mocinhos” da ocasião são os verdadeiros bandidos. Chegou com o espírito de quem dirige um Puma com bombas ameaçadoras. Foi, como se convencionou dizer no final da tarde em Brasília, o emissário de um atentado que falhou na CPI.

Quando estava na ativa, Jair Bolsonaro, então tenente do Exército, admitiu que armou bombas. Hoje o capitão faz pose com metralhadora na mão. Depois da implosão das artimanhas de Dominguetti, o tiro pode ter saído pela culatra. Ou atingir o próprio pé. Como se vê, culpar coronéis é faca de dois gumes. E levar caos a uma CPI repleta de caciques políticos é como tentar tapar o sol com uma peneira.

Registro final: tem-se que o PM vestiu-se de P2. Se foi isso mesmo, a contraespionagem dos ‘militares do presidente’ precisa ter aulas com a KGB, CIA e outros órgãos de inteligência supostamente sérios. Só assim para não cair em orquestrações dignas de republiquetas de bananas.

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