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Haja bombas

Capitalismo aposta em guerra sem resultados para manter caixa

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Andrés Piqueras/Via Pátria Latina - Foto Reprodução

No jogo de morte que o capital desencadeia contra a humanidade neste momento, a guerra que cresce na cena mundial e a violência contra as condições de vida da força de trabalho, têm uma tendência cada vez mais acentuada para varrer do protagonismo político toda a “esquerda do sistema”.

Só a guerra recorrente se revelou eficaz, ao longo da história do capitalismo, para limpar em grande escala os capitais obsoletos e iniciar um novo grande ciclo de acumulação. O problema é que a destruição tem de ser cada vez maior para compensar a dimensão cada vez maior da gangrena e da ficção da economia capitalista – de sobre acumulação de capitais sem qual não bastam guerras parciais, possibilidade de valorização – para a localizadas ou de “pequena escala”, mas é necessária uma nova guerra de dimensões globais.

É o que Henryk Grossmann já afirmava (e anunciava) em 1929: “O imperialismo caracteriza-se tanto pela estagnação como pela agressividade. Estas tendências têm de ser explicadas na sua unidade. Se a monopolização causa estagnação, como podemos explicar o carácter agressivo do imperialismo?

Na verdade, ambos os fenómenos radicam, em última análise, na tendência para a decomposição, na valorização imperfeita devido à sobre acumulação. O crescimento do monopólio é um meio de melhorar a rentabilidade através do aumento dos preços e, neste sentido, é apenas uma aparência superficial cuja estrutura interna é uma valorização insuficiente ligada à acumulação de capital.

O caráter agressivo do imperialismo também deriva necessariamente de uma crise de valorização. O imperialismo é um esforço para restaurar a valorização do capital a qualquer custo, para enfraquecer ou eliminar a tendência à rutura.

Isto explica as suas políticas agressivas a nível interno (um ataque intensificado à classe trabalhadora) e externo (um esforço para transformar nações estrangeiras em tributárias).

Esta é a base oculta do Estado rentista burguês, do carácter parasitário do capitalismo numa fase avançada de acumulação. À medida que a valorização do capital falha nos países numa determinada fase superior de acumulação, o tributo que vem do estrangeiro torna-se cada vez mais importante. O parasitismo torna-se um método para prolongar a vida do capitalismo.

A oposição entre o capitalismo e as suas forças produtivas é uma oposição entre valor e valor de uso, entre a tendência para uma produção ilimitada de valor de uso e uma produção de valores limitada pelos limites da valorização”. Grossmann foi o marxista que, na altura, na minha opinião, melhor compreendeu a formulação marxiana da tendência para o colapso capitalista].

A guerra total tem sido evitada até agora devido ao seu carácter nuclear, isto é, devido às consequências da catástrofe global sem vencedores que acarretaria, embora todas as tendências sistémicas nos tenham arrastado para ela, e já estejamos imersos nas suas primeiras manifestações, que têm vindo a germinar com a otanização de toda a Europa de Leste, mais as batalhas contra a Rússia na Geórgia, na Chechénia, na Jugoslávia e no Azerbaijão, entre outros lugares, até ao seu princípio de eclosão com a ofensiva na Ucrânia.

Este percurso mortífero torna-se ainda mais provável se considerarmos que com a degeneração do capitalismo se dá também a decadência da sua potência dominante à escala planetária, a qual está apostada em dividir o mundo em dois blocos, os que aceitam as suas ordens e os que não aceitam, para empreender a destruição das formações sócio-estatais e das alianças capazes de a aliviar, especialmente a China e as suas redes de interconexões planetárias (mesmo que para isso tenha de se livrar primeiro da Rússia). Ao fazê-lo, força todos os seus subordinados à autodestruição económica e militar (como exemplificam pateticamente a UE, a Austrália e o Japão).

Mas um novo ciclo de guerra de tais dimensões exige também um novo ciclo de fascistização ou nazificação, bem como uma renovada cumplicidade total da (neo-)social-democracia. Além disso, como acabo de dizer, a militarização de todas as formações sócio-estatais diretamente subordinadas aos EUA (alinhadas no seu “bloco” contra o mundo emergente, como o Eixo do Caos contra a Grande Aliança da estabilidade e benefício mútuo nas relações internacionais pretendida pela China).

Esta é precisamente uma declaração do Gabinete de Informação do Conselho de Estado da República Popular da China: O fascismo corporativo ou corporativismo fascista é a única forma que o capitalismo ocidental concebe de organizar a sociedade para a colocar ao serviço das decisões centralizadas do grande capital. É a reação do Ocidente às conquistas do planejamento econômico do socialismo pelo povo chinês organizado no seu Partido Comunista.

A dinâmica errática do “mercado” conduziu a uma concentração cada vez maior do capital em cada vez menos mãos. Uma centralização antidemocrática que procura gerir a política sem ter de sustentar o dispendioso circo mediático da democracia representativa burguesa.

A guerra e o complexo militar dos EUA tornam-se vetores de força maior que subjugam todo o Ocidente ao fascismo corporativo que já vemos em pleno andamento um ano após a resposta russa a 8 anos de provocações nazis no Donbass sob a direção da OTAN.

O fascismo-nazismo que está a ser criado a partir dos centros nevrálgicos da OTAN nesta fase histórica não será certamente uma repetição do que foi forjado no século XX, mas assumirá novas formas, passando despercebido a uma parte significativa da população até cair na sua teia de aranha (inclusive até agora, em grande medida, as opções fascistas ou para-fascistas que estão a crescer no campo eleitoral, por um lado arrastam uma parte importante da população farta de experimentar os golpes do Capital, sob a capa de candidaturas pretensamente iconoclastas e antissistema (um suposto anarco-capitalismo que fala sobretudo de “liberdade”), enquanto por outro lado fazem o papel do ogre das histórias de terror, a fim de que a “neosocial-democracia” pareça aceitável, ou pelo menos um mal menor a apoiar contra o ogre).

Mas já é um fato que as populações europeias estão a familiarizar-se e a aceitar lentamente o fascismo do século XXI, e que apoiam ou se resignam a medidas laborais, sociais, migratórias, fiscais, monetárias, financeiras e bélicas cada vez mais atrozes promovidas pelos órgãos de comando da UE-OTAN (a primeira ao serviço da segunda) e dos seus Estados membros. Tudo isto dirigindo a sua raiva contra os mais fracos (os pobres, os imigrantes, os “diferentes”…).

Seja como for, deve ficar claro, em suma, que na conjuntura da Guerra Total o Sistema não pode permitir discrepâncias democráticas e precisa de um cerrar de fileiras de todas as esquerdas do capital ou esquerdas integradas (“compatíveis”, como a própria OTAN as designou, e muitas vezes “criadas” ou recriadas – remodeladas – por ela própria). E é a isso que assistimos hoje: ao seguidismo da OTAN, passivo e ativo, pelas esquerdas do sistema.

A neo-social-democracia, tanto à frente de governos como na oposição, volta a ser vista como a mais determinada belicista. A seu lado, a neo-esquerda, partidos verdes, nacionalistas e independentistas, assim como os partidos comunistas, aplaudem nazis ucranianos, não se insurgem contra o militarismo-armamentismo da NATO, quando não aprovam diretamente ou manifestam-se a favor do aumento dos orçamentos militares e do envio incessante de armas para algumas guerras, e especialmente para a guerra da OTAN contra a Rússia na Ucrânia.

Tudo isto enquanto apoiam (ou aceitam) o bloqueio à Rússia e a auto-supressão do abastecimento energético, no que é claramente o suicídio econômico, mas também político da Europa, em detrimento acelerado da sua posição no mundo.

Este suicídio explica-se, em grande parte, por se tratar de um pseudo-continente invadido pelos EUA desde a II Guerra Mundial (com dezenas de bases militares espalhadas em grande parte do seu território, algumas delas com armas nucleares), para além de estar cada vez mais ligado à fictícia economia norte-americana.

Daí que a denúncia das guerras capitalistas só servirá de algo (nunca movimentos anti-guerra ou pacifistas impediram uma guerra, porque estas não têm razões “pessoais”, não estão ligadas a considerações éticas ou de valores, mas sim a razões estruturais, geradas pelo sistema capitalista, como parte da violência que todas as sociedades desiguais promoveram), se forem assinaladas a tempo as causas estruturais, muitas vezes cíclicas, que a elas conduzem e os objetivos prosseguidos pela classe capitalista em cada lugar a cada momento, de modo a convocar parcelas crescentes da população para se oporem a esses massacres, o que, por sua vez e posteriormente, implica necessariamente a oposição ao próprio sistema que as gera.

Mas não, nossas esquerdas integradas, sejam “velhas” ou “novas” e institucionais ou não, na melhor das hipóteses optam por não se pronunciar, dão sinais claros de não (quererem) compreender nada do que está em jogo no mundo e nunca apontam as causas profundas subjacentes a cada ação bélica.

Por outro lado, aqueles que supostamente desempenham o papel de encarnar o purismo revolucionário, exibindo o esquerdismo mais inconsciente e cúmplice, como a maior parte do anarquismo e, em geral, as correntes basistas (oriundas ou não do marxismo), bem como o trotskismo internacional, a OTAN cultural (que sabe sempre que lenga-lenga fazer prevalecer em cada esfera social e política), e que estrategicamente move as suas peças políticas de esquerda a cada momento) há muito que lançou a palavra-de-ordem de não estar “nem com um nem com outro lado” nas sucessivas guerras de destruição, por encomenda ou diretas, através de “revoluções coloridas” ou com a intermediação de jihadistas e paramilitares, que os EUA desencadeiam por todo o lado, sozinhos ou com a intermediação de jihadistas e paramilitares. Os EUA desencadeiam por todo o lado, sozinhos ou com a colaboração de alguns dos seus subordinados europeus, ou com a OTAN no meio (como Imperialismo Ocidental Coletivo). Afeganistão, Iraque, Somália, Síria, Líbia, Jugoslávia, Iémen, Sudão… são exemplos dramáticos disso, como forma de destruir a ligação produtivo-comercial-financeira e o entendimento internacional que, com todos os seus defeitos e problemas, a China procura no mundo (parâmetros coerentes com a sua economia produtiva planificada em oposição à economia fictícia e especulativa do Eixo Anglo-Saxónico).

O “nem-nismo” em geral torna-se mais perigoso à medida que assiste, cada vez mais imperturbável e impotente, à aniquilação de sociedades inteiras, à disseminação da barbárie e às agressões imperiais por toda a parte, defendendo sempre uma “paz abstrata”, intemporal, impossível, sem qualquer ideia ou vislumbre da construção de sujeitos internacionais e internacionalistas capazes de enfrentar verdadeiramente cada guerra e, portanto, sem a análise e os fundamentos das possibilidades e dos caminhos da paz, que são necessariamente o oposto daqueles que desencadeiam as guerras no seio do Sistema.

As suas proclamações são, portanto, tão inúteis quanto uma oração. E são-no porque o resultado da “equidistância” (do “nem-nismo”) é invariavelmente deixar as coisas como estão, e os poderes fortes do capital global a vaguearem e a destruírem como lhes apetece.

Ou seja, o “nem-nismo”, como corrente promovida pelos centros de comando global do capital, como slogan e atitude a seguir pelo esquerdismo e pelos socialmente bondosos em relação às suas guerras, torna aqueles que segue tais slogans cúmplices, por vezes conscientes por vezes ingénuos, mas necessários, da barbárie do capital.

O “não à guerra”, sem alternativa política a esta sociedade, está na origem de todas as guerras. Está no comportamento de muitos espíritos sensíveis aos males deste mundo, ao mesmo tempo embevecidos pelas gratificações que a propriedade privada capitalista ainda lhes dá, subjugados pela magnificência do capitalismo, mas que não querem as suas consequências necessárias.

Por isso, contentam-se com o protesto fácil, nascido do mero sentimento negativo (quanto mais fraco, mais festivo e pacífico) do que não querem que aconteça numa sociedade que consideram sua e que ajudam a sustentar iludindo os outros com a sua própria ilusão no “nunca mais” – que, no entanto, acontece vezes sem conta. Guerra do Iraque 2003-08: A luta pela paz é inseparável da luta para fazer prevalecer os princípios científicos do proletariado enquanto classe (nodo50.org). A indispensabilidade do movimento comunista.

Porque a paz no seu sentido pleno (não como ausência de focos de conflito nem como submissão aquiescente) significa a eliminação das desigualdades e das opressões. E no caminho para a sua conquista é por vezes necessário apoiar intervenções militares defensivas e certas ações virulentas, não muito agradáveis, não muito “leves”, das próprias lutas de classes.

Porque a grande política não é uma dança de salão em que os interesses antagónicos da classe dominante em relação ao resto da sociedade se resolvem com conversas e boas intenções.

Porque, como bem o demonstram as palavras do meu querido Brecht com que iniciei este artigo, as elites do capital continuarão a fazer a guerra, e cada vez com mais intensidade, à medida que se esgotam os recursos básicos, que se estrangula o combustível do valor e que cai a taxa de lucro real e produtivo. Por mais que tentemos fechar os olhos e dizer “não à guerra” e “nem um nem outro”.

Por isso é imperativo organizarmo-nos para o que aí vem, por isso é essencial saber qual a nossa posição no tabuleiro geopolítico onde está em jogo o destino dos povos, o da verdadeira PAZ e soberania, saber quem apoiar em cada momento face ao Império da OTAN, quem se defende e quem ataca apesar das aparências, junto de quem há mais hipóteses de conseguir o fim de um ou outro surto de guerra, mesmo que a sua realidade sócio-política não seja a nossa ideal.

Vale a pena recordar mais uma vez as palavras de Lenine de 1915: “Nós, marxistas, diferimos dos pacifistas, assim como dos anarquistas, porque reconhecemos a necessidade de analisar historicamente (do ponto de vista do materialismo dialético de Marx) cada guerra separadamente”.

E em 1917: “Nós, marxistas, não somos opositores incondicionais de qualquer guerra. Dizemos: o nosso objetivo é o estabelecimento do socialismo que, ao eliminar a divisão da humanidade em classes, ao eliminar toda a exploração do homem pelo homem e de uma nação por outras nações, eliminará infalivelmente toda a possibilidade de guerra em geral”.

Se há algo que parece claro, é que no jogo de morte que o capital desencadeia atualmente contra a humanidade, a Guerra que engorda na cena mundial e a Violência contra as condições de vida da força de trabalho, têm cada vez mais uma tendência acentuada para varrer o conjunto das “esquerdas do sistema” do protagonismo político relacionado com a ação reativa das populações nos próximos lustros. Porque tais esquerdas já mostraram que não têm nada de real, eficaz, para opor à crescente barbárie do capital, depois de se haverem integrado mansamente (como queria a burocracia social-democrata da II Internacional) na dinâmica (hoje já decadente) da acumulação do capital.

Vejam-se, por exemplo, as esquerdas integradas (que fazem parte do governo espanhol) do Reino de Espanha: todas submissas à OTAN e à UE. Sem o questionamento destas instituições, falar de “paz”, “direitos humanos”, “bem-estar dos povos”, “apoio a Gaza” ou outros slogans que lançam não passa de comprimidos para narcotizar as populações.

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