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Chover no molhado

Congresso vira máquina de enxugar gelo com a anistia para golpistas

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Júnior - Foto Lula Marques/ABr

É uma cena dantesca, típica de falsos mártires, mas, partindo de quem partiu, nada é anormal. Minutos antes de se submeter a uma cirurgia para soltar o intestino preso antes do juízo final, o ex-presidente Jair Bolsonaro teve tempo de exercer um de seus maiores prazeres: o de peitar gratuitamente o Poder Judiciário, notadamente o ministro Alexandre de Moraes e todos os que avaliam como criminosos aqueles que vandalizaram a Praça dos Três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023. Do leito hospitalar, ditou ou escreveu uma mensagem de apelo aos parlamentares em defesa da anistia aos condenados pela barbárie. É uma rogativa que ele mesmo sabe será em vão, algo como chover no molhado.

Obviamente que o repetitivo ponto tem um nó no fim da rombuda agulha. Como novela inacabada, os bolsonaristas creditaram mais esse capítulo à facada pré-eleição de 2018. Embora tenha sido um deputado federal de poucos ou nenhum projeto, Bolsonaro sabe que, na irreal hipótese de um gran finale da ópera bufa dos congressistas aliados, seria ele o grande beneficiado. No texto, Jair pede para que os engarrafadores de fumaça do Congresso imaginem a cena da “Polícia Federal arrancando a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos de casa, com seus filhos de 10 e 7 anos chorando, sendo levada de volta à penitenciária”. Realmente triste e lamentável para essa família.

Faltou o ex-mandatário lembrar que, na ocasião, Débora deixou os filhos e partiu para uma batalha que ela sabia injusta e ilegal. Bolsonaro também esqueceu da tristeza que seria para o país e para o povo brasileiro se a moça do batom e seus “companheiros” não tivessem fracassado. Certamente muitos dos que defendem a democracia seriam mortos, a começar pelo próprio Alexandre de Moraes. Na sequência, a violência estimulada pelos “patriotas” entrincheirados em locais não sabidos alcançaria o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin.

Curiosamente, Bolsonaro passou mal no mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal abriu a ação penal contra o núcleo central da trama golpista de 2022, justamente a que transformou em réus oito denunciados, entre eles Jair Messias e os generais Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio de Oliveira. Torço pela sua rápida e plena recuperação. Na mesma proporção, espero que ele, se for condenado pelo STF, pague o mesmo preço que, caso vitoriosos, seus servis colaboradores cobrariam daqueles que se opuseram e se opõem à tirania.

Da mesma forma que cabe à Justiça condenar os que vivem à margem da lei, é papel de qualquer condenado lutar até o fim pela liberdade, desde que por meios legais. Ilegal é se utilizar de um descompromissado Congresso Nacional para fazer valer o que é comprovadamente inconstitucional. É a prova de que o crime compensa para boa parte dos atuais congressistas, inclusive alguns desprezíveis e indecentes parlamentares da combalida esquerda. Esse é um novo golpe dentro do golpe dos chamados “patriotas”. Se eles se julgam inocentes, por que fogem?

Condenados, presos e liberados para cumprir pena domiciliar, a advogada Edith Christina Medeiros e o blogueiro Marinaldo Adriano Lima romperam os lacres de suas tornozeleiras eletrônicas e, a exemplo de outros “camaradas”, desapareceram. Aprovado o projeto da anistia por esse Congresso vil e mercantilista, certamente eles voltarão mais fortes e sem limites. Permanecerão dessa forma até que os ministros do STF novamente se reúnam para definitivamente informar aos carentes mentais que a ação criminosa de grupos armados contra o Estado é inafiançável e imprescritível. Ou seja, que os enxugadores de gelo denominados homens públicos entendam de uma vez que contra os fatos não há argumentos.

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Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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