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Contraste ideológico PT-PMDB marca disputa eleitoral dos gaúchos

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De um lado, o único partido legalizado de oposição aos governos militares da ditadura e o único que passou a estar sempre no governo desde as primeiras eleições após o período; do outro, a sigla que deu voz às reivindicações de trabalhadores e operários, cresceu sob o comando de um sindicalista do setor metalúrgico e que, hoje, à frente do governo federal, possui em sua base aliada siglas de quem já foi crítico ferrenho. PMDB e PT, embora em nível nacional sejam aliados e juntos concorram à reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT) e do vice Michel Temer (PMDB) no Rio Grande do Sul, ambos são adversários históricos, em mais uma disputa.

PMDB e PT são os maiores partidos do País em filiados, com respectivamente 2.356.091 (15,36% do total) e 1.590.304 (10,37%) inscritos. No Rio Grande do Sul, o PMDB é a segunda maior sigla em número de filiados, com 249 mil nomes, e tem o maior número de prefeitos, 134. A bancada do PMDB na Assembleia Legislativa tem oito deputados estaduais e, na Câmara, a sigla é representada por quatro deputados, além de, até o 31 janeiro de 2015, contar com o senador Pedro Simon, que não foi reeleito para mais uma legislatura.

Na avaliação do presidente do partido no Rio Grande do Sul, deputado estadual Edson Brum, em comparação ao PMDB nacional, a sigla estaria mais alinhada a um espectro de centro-esquerda, em decorrência de personalidades tradicionais do partido. “Temos nomes que vieram da esquerda, como Ibsen (Pinheiro, ex-deputado federal e candidato a deputado estadual, não eleito no pleito deste ano), que era do PCB”, cita.

No entanto, para o cientista político Rafael Madeira, coordenador do Centro Brasileiro de Pesquisa da Democracia, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs), a proximidade com partidos como PP e DEM (cujas bases ideológicas vêm da extinta Aliança Renovadora Nacional, a Arena, que representava o governo militar) e PSDB, ainda que com o objetivo de se opor ao PT, coloca o PMDB gaúcho à direita, em nível local.  “A dualidade entre o PP e o PMDB, derivados da Arena e do MDB, perdurou no Estado ao longo da década de 1980, até o PT passar a ter envergadura local. PP e PMDB são adversários históricos, mas aqui eles resolveram suas diferenças e, desde então, vêm compondo governos, independentemente de quem esteja na cabeça de chapa”, analisa.

Em quarto lugar no ranking dos partidos com mais filiados no Estado (147.486 inscritos), o PT comanda 73 prefeituras e conta com a maior bancada, tanto na Assembleia, onde é representado por 14 deputados estaduais, quanto na Câmara, com oito cadeiras. Tem um senador, Paulo Paim, em seu quarto mandato, além de ter governado o Estado de 1999 a 2002, com Olívio Dutra (PT), que foi derrotado no pleito deste ano, quando se candidatou a senador.

Embora, no âmbito ideológico, o PT seja um partido de esquerda, nacionalmente, está no mesmo caldeirão de composições partidárias variadas, contando com o apoio de siglas que já foram suas adversárias, como o PP, que no Rio Grande do Sul foi seu principal rival na disputa de primeiro turno pelo Piratini em 2014. Mas o partido que atualmente mais dá sustentação à base governista é o PMDB, com 71 deputados na Câmara, atrás apenas do próprio PT, que tem 88 nomes.

De acordo com o presidente do PT gaúcho, Ary Vanazzi, a aliança não compromete a orientação esquerdista da sigla. “São duas coisas diferentes. Uma é o que queremos para o Brasil, como partido, outra é a governabilidade. Não tem como chegar a um governo e implementar algo de cara.” Para o petista, apesar da luta histórica pela garantia de liberdades individuais, o PT aprendeu que os espaços conquistados são insuficientes. “Precisamos construir mais instâncias de participação popular.”

Já as bandeiras defendidas pelo PMDB gaúcho passam, obrigatoriamente, pela revisão do pacto federativo, à qual o Estado está submetido para a obtenção de repasses de recursos. “Não podemos ficar sempre de chapéu na mão, pedindo para Brasília”, critica Edson Brum, que também tem postura combativa em relação à burocracia estatal. “Se o Estado não fomenta e não ajuda, não pode atrapalhar”.

Surgido em 1966 a partir da instituição do bipartidarismo, com a promulgação do Ato Institucional nº 2, em 1965, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que deu origem ao atual PMDB em 1980, uniu nomes não cassados de partidos da época, como PTB, PSD, e de siglas então clandestinas, como o PCB. “O grande fator de coesão do MDB era a oposição moderada ao regime, e minoritário em relação à adversária Arena”, resgata o cientista político Rafael Madeira.

A volta da democracia e das eleições diretas colocou o PMDB em um papel dominante no sistema partidário brasileiro, tirando a sigla da oposição e a colocando, desde 1985 (com a morte do presidente indiretamente eleito Tancredo Neves, antes de sua posse, substituído por seu vice José Sarney), na posição de governista, papel que exerce desde então, sempre como um dos  aliados ao governo. De acordo com Madeira, isso ocorre porque a principal estratégia para se manter no poder é a preferência em não ter um candidato próprio à presidência, mantendo o foco em sua presença parlamentar e em estados e prefeituras.

“Quércia (Orestes, do PMDB paulista e ex-governador de São Paulo) foi candidato uma vez, em 1994, e não obteve destaque. Apesar de ter a maior parte dos governos estaduais e da Câmara dos Deputados na época, sua principal liderança, Ulysses Guimarães, também não teve votação expressiva em 1989”, explica o acadêmico, para quem o “PMDB representa uma coalizão forte em função das cadeiras que controla”.

Além de marcar a fundação do PMDB, o fim do bipartidarismo, decretado em 1979, permitiu a legalização e a fundação de novas siglas, como o Partido dos Trabalhadores (PT), criado oficialmente em 1980. Ele buscava promover mudanças na vida de trabalhadores da cidade e do campo, contando com a militância de personalidades da esquerda, intelectuais e artistas, de acordo com a cientista política Lucileia Colombo, do programa de pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs).

“Foi em um contexto político, econômico e social marcado por intensas mobilizações que o líder sindical e principal fundador do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, também tornou-se um dos protagonistas da história do partido.” Em crescimento constante desde sua fundação e apesar da votação expressiva obtida por Lula nos primeiro e segundo turnos das eleições presidenciais de 1989, o petista perdeu para Fernando Collor (na época do PRN e atualmente senador pelo PTB) e foi derrotado também nos pleitos de 1994 e 1998, quando Fernando Henrique Cardoso (PSDB) foi respectivamente eleito e reeleito.

“No entanto, o partido disputou eleições e buscou legitimar e consolidar sua representatividade no Executivo e nos parlamentos. Esse empenho deu resultado nas eleições para a presidência de 2002, 2006 e 2010”, explica, falando sobre a eleição de Lula, reeleito na sequência, e a mais recente eleição de Dilma Rousseff (PT). Ambos venceram calcados na preocupação com a área social, e programas e políticas voltadas prioritariamente à porção mais pobre da população. Segundo Lucileia, o presidencialismo de coalizão vivido no Brasil mudou em parte a personalidade do PT, que tinha um perfil de oposição bem delineado. “A égide de garantia da governabilidade fez com que o partido aceitasse o acordo com outras siglas. Mesmo com ênfase na área social, não deixará de dialogar com outras correntes presentes em partidos de centro e de direita”, avalia.

A vida institucional e a atuação pública dos dois partidos não ficaram fora do escopo das manifestações de rua, que tiveram seu ápice em junho de 2013, e que questionaram, além da qualidade dos serviços públicos, a efetividade do sistema político representativo.

Lívia Araújo/Jornal do Comercio

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