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Democracia e tirania

Cruz do Centrão arde e joga cinzas negras na estrela de Lula

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Júnior - Foto de Arquivo/Marcelo Camargo - ABr

Hoje eu estou naqueles dias. Não é o que você pensou, mas garanto que estou bem próximo disso. É um daqueles dias em que a gente acorda e percebe que, apesar de avermelhado, o Brasil não consegue sair do lugar. O governo vitorioso se mexe daqui pra lá e de lá para cá e nada acontece. Tem uma cruz enterrada sobre vampiros insepultos no meio da praça e é ela que impede a movimentação do país. Na verdade, os vampiros geraram filhotes e eles não param de sugar o que podem de todos, inclusive e sobretudo de quem a população escolhe para governar uma massa que ainda não faliu por obra e graça do povo do céu. Não é à toa que vez por outra somos comparados aos caranguejos, principalmente os carniceiros, que se alimentam de restos de seres vivos.

Crustáceos ou não, parece que realmente nos acostumamos a andar sem pressa e frequentemente para trás. Tem sido assim desde que o partido da boquinha, o que lidera o chamado Centrão, cuja preocupação maior é torcer pelo atraso, de modo que o governo esteja sempre à reboque e eles não percam o comando do cofre. São maus vizinhos, péssimos parceiros de peladas, terríveis companheiros de happy hour e perfeitos na divisão do din din do Erário. Obviamente que o naco maio é deles. Que o digam os caciques da tal legenda clássica dos filmes de gangster. Eles são os próprios e não fazem questão de esconder o óleo que lubrifica a cara de pau.

Historicamente, para eles, o povo, de dois em dois anos também conhecido por eleitor, é um mero detalhe. Por conta da atuação dos parlamentares que compõem a sigla, no Brasil de nossos dias o anormal virou normal. É a política refletindo o que eles acham do brasileiro. São os políticos que perderam a vergonha e, diária e radiofonicamente, dividem os seres humanos em duas classes bem distintas: instrumentos e inimigos. Parafraseando o dramaturgo e poeta alemão Bertolt Brecht, continuar se omitindo da política é tudo que os malfeitores da vida pública mais querem. Como cidadão esclarecido, estou convencido de que, na política, somente duas coisas são imutáveis: a ingenuidade do eleitor e a desonestidade do político.

E essa ingenuidade ficou absolutamente clara na eleição envolvendo a democracia de Luiz Inácio e a tirania de Jair Messias. Inventaram uma tal polarização, que nada mais é do que uma real inversão de papéis, ou seja, o político elege o povo para representá-lo. Na prática, quem polariza é a base de apoio de um e de outro candidato. A gente briga, vira inimigo e eles, após eleitos, comem no mesmo cocho. É mentira? José Saramago, o escritor português de textos intermináveis, disse certa vez que os políticos são a mentira legitimada pela vontade do povo. Pode parecer piada pronta, mas é tão verdadeira que os próprios se traem: uma vez no Congresso, nas assembleias ou nas câmaras municipais, eles em geral fazem tudo ao contrário do que prometeram durante a campanha.

Acostumado a defender ideias e não políticos, me imagino bem distante da burrice plena. Também não tenho ideias curtas. Por isso, estou certo de que os simpáticos homens públicos são amigos do povo e bajuladores do povo somente na hora do voto. Considerando que políticos ruins não caem do céu, insisto na tese de que acreditar em promessas de candidatos é ter concepções e conceitos ingênuos, infantis ou mercantis. De minha parte, alcancei a máxima do investidor e filantropo norte-americano Warren Buffet, para quem honestidade é um presente caro. Por isso, não espero nada de pessoas baratas.

É triste e inócua qualquer tentativa de mudança. Os mais sábios perderam a paciência e não aceitam mais tentar esclarecer os menos esclarecidos sobre aqueles quatro passos para ser feliz: Deixe/De/Ser/Besta. É claro que esta narrativa não objetiva transformar meus leitores em apolíticos ou desinteressados pelo assunto. Pelo contrário. A estes lembro que o maior castigo para quem não se interessa por política é que serão governados por quem se interessa. Depois, as churumelas de nada adiantarão. Lembro também que tudo que começa com uma mentira termina em decepção. Jair não me deixa mentir.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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