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Ser não é parecer

Deus acima de todos é sinônimo de poder do povo

Publicado

Autor/Imagem:
Adailton Braga

A Bíblia vende pelo menos 25 milhões de exemplares por ano, em mais de 100 idiomas. E apesar da crítica atual a toda religião organizada, ainda é o maior best-seller do planeta. O Novo Testamento traz a história de um mestre Judeu itinerante chamado Jesus com as fundamentais mensagens muito lembradas por religiosos e não religiosos, e fracamente vividas na dimensão prática na nossa sociedade, que é de fundamento cristão.

São fundamentos fáceis de lembrar: a glória de Deus se expressa em minha vida (bem compreendida, nossa vida); a cada dia presente, deparo com oportunidades maravilhosas; Deus opera através de homens e mulheres; vejo Deus em todas as pessoas, de forma aberta, independentemente de suas condutas; vejo Deus se manifestar em todas as coisas; minha mente é equilibrada, serena e calma; venha a mim com seu trabalho e lhe darei descanso; sou a atividade de Deus e essa atividade é sempre boa.

Logo, Deus é vida vivida no presente, aqui e agora, nas palavras e ações, principalmente. Se entendemos que Deus está acima de todos, essas são regras a serem praticadas e vivenciadas à cada respiro, ação e decisão.

Deve ficar bem compreendido que Jesus falava sempre de forma ampla, coletiva, extensiva. De acordo com suas mensagens, dominar os outros não é a maior nem a melhor forma de poder, se o crédito for dado as mensagens de Jesus. Jesus nunca estabeleceu o poder político que seus seguidores esperavam, nem antes, nem depois, nem agora. Portanto, em nenhum momento do tempo histórico. Se forem seguidas ao pé da letra, suas mensagens não podem ser negligenciadas. Seus discípulos devem e precisam fugir do jardim se conhecerem e desejarem apenas o poder e a autoridade sobre os outros.

Do impacto pessoal com Jesus, quando há de fato, surge a mudança de vida. E quem de fato muda, adquire a capacidade da mudança de outros por instinto, de forma intuitiva. Os discípulos, quando há, perderam o medo e saíram, e saem, contando a todo mundo como suas vidas tinham sido poderosamente transformadas por Jesus. Contextualizando: urge habitar no momento presente a mesma conduta de refletir a boa nova. Relembrando: Jesus não tinha interesse em dominar, nem usufruir de nenhum poder, ou riqueza, ou ostentação do ego, sua meta era a transformação dos corações humanos.

Jesus não precisava controlar as pessoas pelo medo, pela crítica mordaz e nefasta, pelo pisotear, pelo dedo em riste. Por mais degradante fosse a situação dada, ele podia transformá-la pelo amor e assim alcançar muito mais, coisa que seus seguidores, no presente, demonstram não ter compreendido, apreendido. Isso em todas as religiões. Percebe-se a olhos vistos, dentre seus ditos discípulos.

A história mostra que Jesus sempre desconfiou das pessoas que o seguiam. Isso se repete hoje, principalmente das que mais falam em seu nome. É certo que todas as religiões são fundamentais para o bom equilíbrio social, mas também cabe pontuar que no Brasil as religiões não têm cumprido sua missão à contento, haja visto as dificuldades abissais que vivenciamos em nosso país em termos de barbáries em todas as suas formas, em diferentes ambientes.

Voltando a reflexão sobre o poder, na visão de Jesus: o poder precisa ser uma fonte de orientação, de coragem, motivação e, sobretudo, tornar-se um farol para todos os que buscam direção, principalmente os mais necessitados, moral e materialmente. Jesus, porém, ensinou que a única maneira de encontrar poder verdadeiro é abrindo mão do controle.

Isto significa que precisamos estar abertos para a ajuda de alguém. É essencial que precisamos mudar o significado de poder entre nós, disseminado e exercido em todos os níveis, para que Jesus possa aumentar o seu poder em nós. Não aceitar renunciar à necessidade de controle, é a nossa vulnerabilidade, se o norte for a mensagem de Jesus. Tentar se manter sempre no controle provoca um sentimento de fraqueza que leva ao caos social, porque não é possível estar permanentemente nessa posição. Fica claro, assim, que qualquer pessoa que usa a religião e o poder para tentar controlar a si mesmo ou a outros, demonstra medo de sentir-se fraca, já estando então aí presente em movimento dinâmico a sua fraqueza, não sendo essa a conduta da qual Jesus falava.

As palavras autoridades e poder no Brasil têm um sentido muito negativo, porque sempre denotam controle, abuso e exploração da sociedade de maneira perversa, nepotismo, corrupção, privilégios e benesses desmedidas, omissão, conivência e complacência. Ou seja, com esse tipo de conduta usual e histórica, a autoridade e o poder no nosso País são sempre fracos para enfrentar as dificuldades da sociedade e suas demandas, sendo essa a pior das mortes que todos vivenciamos desde sempre, e que tem gerado todos os males no sentido amplo.

Nós brasileiros, em geral, precisamos semear uma nova plantação, que germine a capacidade de transcender as necessidades mais elementares desse controle posto sobre nossas cabeças, de um tão alardeado Deus acima de todos, tão arraigado na nossa cultura, tendo em vista que a mensagem de Jesus jamais expressou isso, para viver por alguma coisa maior do que nós, espacialmente falando, que seja reta e justa, construída com equidade, que objetive o conjunto da sociedade. Jesus estava focado na sua relação pessoal com Deus e expressa na relação com as pessoas, e não em conquistar o mundo para si mesmo.

Se somos um País cristão, como alardeamos, Jesus nos ensina a amar os inimigos, e não, esmaga-los. Se somos um país de fundamento Cristão é preciso parar de buscar o poder sobre os outros e, em vez disso, criar poder com os outros. Jesus em vez de tentar controlar as pessoas, ele escolheu liderá-las com autoridade. Autoridade é o compromisso que uma pessoa assume de servir de inspiração para que os outros se tornem aquilo para o qual foram criados, que é atingirem o melhor de si mesmos, em prol de si mesmos e do conjunto da sociedade.

Quando de fato, e se de fato alcançamos Deus, temos sintonia intuitiva com ele, podemos ser usados por ele para inspirar todas as pessoas que nos cercam, sem medo, sem ódio, sem o dedo em riste. Seguir o exemplo de Jesus não se trata de seguir uma religião, uma filosofia, ou uma ideologia – trata-se de uma maneira de viver o presente, a cada ato de forma justa e reta. Aqueles que descobriram esse estilo de vida mudaram tanto a própria perspectiva quanto o caminho de milhares de pessoas ao seu redor.

Viver qualquer tipo de poder com autoridade significa comprometer-se com o bem dos outros e abrir mão do medo e da satisfação do próprio orgulho. Se expressa em viver comprometido com o bem dos outros, na sua totalidade, em vez de controlá-los e dominá-los. Somos capazes de superar as situações mais desesperadoras com o poder que emana das relações pessoais, essência da mensagem de Jesus.

O poder verdadeiro é o poder com os outros e não sobre os outros. Jesus deseja que os seus seguidores sejam inspirados sem perder de vista a vida como é vivida, com seus conflitos e contradições. Quando contemplamos qualquer ensinamento com a devida profundidade, principalmente os de Jesus, é preciso que sejamos colocados face a face com nós mesmos e com a nossa visão de mundo. Daí, é simples perceber que a pessoa boa produz o bem a partir do bom tesouro do seu coração, e a pessoa má produz o mal a partir do mau tesouro que fincou raízes no seu coração, pois é a partir do coração que fala a boca (Lucas 6:43-45). Vale lembrar Mateus 7:1-2: Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis também julgados, e a medida que usardes para dar será a medida segundo a qual recebereis.

São reflexões que sugerem que é preciso ser o mais possível, e parecer o menos possível. E o fato de o Estado ser laico não pressupõe que ele seja desumano, covarde, desonesto, parasita, explorador, como historicamente tem sido no Brasil de forma tão nítida. Pressupõe que ele é o principal responsável pelo exemplo à sociedade de retidão e justiça e pela construção da equidade social no sentido amplo.

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