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Governo no fim deixa herança maldita para Lula administrar

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Júnior* - Foto de Arquivo

Até 31 de dezembro, ponto final de um tenebroso e sombrio período político, teremos de conviver com o pior dos métodos da política: o acovardamento diante de uma derrota que, mais do que necessária, foi determinante para a recuperação do país como nação que ainda almeja ter um futuro. Com todas as pompas, após quatro anos de isolamento, o Brasil voltará a desfilar no cenário internacional com galhardia e sem constrangimentos. Como patriota sem fantasias ou adereços no pescoço ou no automóvel, não tenho prazer algum em concordar com a tese de que um presidente em fim de mandato ficou cerca de 20 dias sem trabalhar e, comparados com os 48 meses de administração, esses foram os melhores dias para o povo brasileiro.

Apesar do veneno da afirmação, o fato é que, enquanto houver Bolsonaro e sua tribo do ódio, haverá motes para narrativas diárias. É um tema recorrente, por demais cansativo, mas fundamental como justificativa. É a forma de não deixar morrer a fase em que, por pouco, não fomos empurrados ladeira abaixo. Passou, mas o bolsonarismo jamais será esquecido. Por exemplo, impossível esquecer dos quase 700 mil mortos pela Covid, dos cortes no orçamento das universidades federais, do orçamento secreto, das rachadinhas, da morte por fome, do desemprego em série, do desmatamento criminoso da Amazônia, do garimpo ilegal em terras yanomamis, do sigilo de 100 anos em questões envolvendo o clã Bolsonaro, entre outros traumas insuperáveis.

Como onde há vida sempre há esperança, vamos lutar juntos para vencer e sair do outro lado. Embora ainda haja bolsonarista perdido sob as marquises defronte aos quartéis, não há mais hipótese de os “patriotas” golpearem a democracia. Na verdade, nunca houve, apesar dos arroubos do presidente derrotado e do seu entorno mais radical. O ano está acabando. A terra vermelha do cerrado se encarregará de enterrar o entulho, a herança maldita desses últimos quatro anos. O período acabou no ralo. Perdemos décadas de desenvolvimento, mas o desfecho foi de um ganho incomensurável para o povo brasileiro: nos livramos do gerador do caos, do mito de barro.

Particularmente sempre me lembrarei de que, em 2022, além da estonteante vitória de Luiz Inácio, houve um movimento golpista que ficou conhecido como o Grande Mimimi ou o Chororô da Elite Desmamada. Mais do que Lula da Silva ou qualquer conceito ideológico, a recuperação do orgulho nacional é o que devemos comemorar na manhã de 1º. de janeiro de 2023. Será o resultado de nosso esforço por algo que tanto desejamos: a perenidade democrática. Como dizia Fernando Pessoa, o mais universal dos poetas portugueses, tudo vale a pena quando a alma não é pequena. A dos brasileiros que nunca quiseram a volta do irmão do Henfil definitivamente é uma das menores e a mais perversa da terra de Deus acima de todos.

Presidente diplomado e golpistas sob controle, poderemos começar a sonha com a paz e com o amor. A partir desse dia, talvez consigamos mostrar aos defensores do ódio que divergência de opinião jamais deve ser motivo para hostilidade. Também devemos lembrar aos vitoriosos a desnecessidade de entrar para a história para fazer um mundo melhor. Em resumo, aquele que não é capaz de governar a si mesmo não será capaz de governar os outros. Foi o que vimos e experimentamos nesses últimos quatro anos. Lutemos para que nunca mais tenhamos dias em que a gente se sente como quem partiu ou morreu.

Quanto a incontroversa vitória de Lula da Silva, é bom o povo conhecido por contribuinte se preparar para o pior. O cenário é de terra arrasada. Tudo indica que, por falta de propostas e projetos do governo que se finda, o Brasil terá de ser refeito, provavelmente reinventado. A hipótese de caos anunciado me faz refletir sobre uma máxima recente da direita, para a qual, quando a esquerda perde uma eleição, ela tenta destruir o país. Quando ganha, consegue. Interessante para quem não raciocina. Para quem pensa, bastam dois segundos para se concluir que quem está no poder desde 2018 é justamente a direita. Portanto, a quem culpar pela destruição?

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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