Asa Sul
Maria Augusta, idosa bondosa, perdeu Fifi e ficou com Gordurinha Mole
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Maria Augusta, que passara boa parte da vida tomando conta de filhos, netos e gatos, de repente, se viu sem tais obrigações. Fifi, a derradeira felina, aos 18 anos, foi dormir e não mais despertou.
A velha, após viver o luto por quase seis meses, se viu sozinha naquele amplo apartamento na Asa Sul, para onde havia se mudado por conta do trabalho. Entretanto, já aposentada, apesar da vontade de retornar para o litoral, acomodou-se à secura do Cerrado.
Pensou em pegar um bichano, mas desistiu ao se lembrar da própria idade. Viveria mais quantos anos? Gatos vivem tanto, que era capaz do guri ficar órfão. Não, isso ela não queria. Já pensou se o seu herdeiro fosse parar na rua? Pior seria se caísse nas mãos de algum desalmado. Não, não e não! Nada de gatos.
Entre idas e vindas à padaria da quadra, Maria Augusta não conseguiu evitar a própria curiosidade e entrou em uma loja de animais. Caminhou entre os inúmeros aquários e até teve ímpeto de comprar um peixe. Desistiu, pois gostava do toque, que confortava o coração tão acostumado a afagos. E, já saindo do estabelecimento, se deparou com um pequeno monte de pelos encolhido em uma gaiola.
— Ei, tem um bicho morto aqui.
— Não, minha senhora. Isso é um hamster.
— Hamster?
— Sim, um hamster. Esses animais dormem durante o dia.
— Hum!
— São ótimos animais de estimação.
— Hum! E vivem muito?
— Em média, vivem uns dois anos.
— Só isso?
— Sim.
Maria Augusta pensou, pensou e, então, concluiu que ainda tinha ao menos dois anos pela frente.
— Ótimo! Vou levar.
Cuidadosa e preocupada com o conforto da Gordurinha Mole, nome que escolheu para a mais nova integrante da família, a idosa tratou de comprar um enorme terrário, com direito a roda-gigante e escadinha, que foi colocado no quarto, bem ao lado da cama. Assim que despertava, Maria Augusta observava aquele monte de pelos e, delicadamente, fazia leve cafuné na dorminhoca. De vez em quando, a hamster abria os olhos e encarava a velha, como se dissesse:
— Ah, mamãe, que gostoso. De noite a gente conversa.
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Eduardo Martínez é autor do livro 57 Contos e Crônicas por um Autor Muito Velho’
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