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Passarela da Vila

Máscara encobre samba de Ibaneis na pata do Jabuti

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Monteiro

Pesquiso e trabalho com samba e carnaval há anos. Por conta dessa atuação fiz inúmeros amigos nesse meio, e posso dizer que conheço um pouquinho dessa praia. Sou apaixonado por todas as escolas de samba, mas a Unidos de Vila Isabel está entre as que tenho maior carinho e admiração. Não fosse por Noel ou Martinho, seria pelos diversos amigos torcedores da Vila. Diletos amigos!

Mas, amigos, amigos…negócios à parte. E consultando vários desses amigos distribuídos por Brasília, Rio de Janeiro e até de São Paulo; ninguém entendeu até agora de onde surgiu a idei do Governo do Distrito Federal de definir a Vila Isabel como escola para homenagear Brasília com enredo sobre os 60 anos, no carnaval de 2020.

É inevitável a comparação desse episódio com aquela folclórica história dos jabutis não subirem em árvores. Portanto, quando avistamos algum deles lá em cima, é porque alguém o colocou nos galhos.

Dirigentes de escolas de samba de Brasília contam, com ares de inconformismo, que há pouco mais de um mês desembarcou na capital da República um casal embarcado no Rio. Ambos integrantes da Vila Isabel. Teriam vistoriado algumas quadras de agremiações; fizeram perguntas; postularam teses relâmpagos e sugeriram alterações, mudanças etc. Tudo à primeira vista. Na lata. Sem pesquisa. Só diagnóstico instantâneo. A parte feminina do casal sempre à frente das decisões, dando a última palavra.

Eis que agora sabemos que a senhora visitante é a comandante do projeto carnavalesco da Secretaria de Cultura do Distrito Federal para o próximo carnaval. Delma Barbosa teria sido passista e atuado em outras funções na Vila, até chegar à área de Marketing. Antes deu uma passada no Salgueiro, até sair junto com a ex-presidente, Regina Celi, deposta em um processo tumultuado. Aliás, Delma é apontada como uma pessoa atuante, mas de temperamento e comportamento bem complicados.

O pacote anunciado pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), já embalado e embrulhado, deixa muitas dúvidas. Começando pelo acordo de cooperação que ainda não foi detalhado. A contrapartida da Vila, em oferecer capacitação aos carnavalescos e foliões brasilienses, que eles sequer conhecem. Como será o projeto pedagógico? Como farão a distribuição por níveis de conhecimento? Quem são os professores? E os currículos? Qual o valor da contrapartida? Locais? Períodos? Logística? Essas e outras milhões de perguntas estão sem resposta.

Mas o mais curioso ainda está por vir. Qual foi o critério usado para escolher a Vila Isabel? Não houve concurso ou seleção. A escola não tem nenhuma parceria anterior por aqui, ou outro projeto qualquer já realizado em Brasília. Não venceu concorrência pública. Não há, portanto, nenhuma justificativa aparente para a escolha.

A Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro – Liesa, mantém um ranking oficial das escolas de samba do Grupo Especial, baseado nos resultados dos últimos 5 anos. Na classificação atual a Portela ocupa o 1º ligar, seguida por Mangueira, Salgueiro, Beija-Flor… Esse poderia ter sido um dos critérios, mas nessa lista a Vila Isabel ocupa apenas a modesta 9ª posição ao lado da Paraíso do Tuiuti.

O fato de a Vila ter apresentado neste ano um enredo sobre a cidade de Petrópolis, ou ainda, a informação de que o grande Martinho da Vila faria o enredo e o samba, são argumentos fragilíssimos. Segundo uma fonte da própria Vila, a tal sinopse escrita por Martinho, teria sido rejeitada pelo departamento de Carnaval da escola. E quanto a autoria do samba, quem conhece minimamente o assunto sabe que em escolas tradicionais não há a menor possibilidade da escolha de um “samba biônico”, ou seja, sem o tradicional concurso de samba enredo. O Martinho, como outros compositores, já ganhou muitos e perdeu outros tantos.

Além de todas as empulhações (no dicionário aparece como sinônimo de logro, tapeação, embuste, mentira) apresentadas até agora pela Secretaria de Cultura, como argumentos, ainda há mais alguns agravantes: nenhuma outra escola do Rio de Janeiro sequer foi consultada sobre o interesse e a possibilidade de apresentar esse enredo sobre Brasília em 2020. A conversa mole de que o GDF vai “ajudar na captação do recurso”, não convence ninguém. Sobretudo, na atual conjuntura, nenhuma grande escola entraria em projeto dessa magnitude, sem a mínima garantia.

O governador Ibaneis, esteve este ano no desfile das campeãs do Carnaval carioca. Teria ele se apaixonado pela coroa, símbolo da Vila Isabel? Seria a influência de algum partido político, simpatizante da Cultura? Será que algum empresário local vai bancar, a título de alguma contrapartida?

Quem vai pagar essa conta? Sobre isso, correm informações de que o governador teria tido mais um de seus rompantes, e dito: “Deixa que eu pago do meu bolso”. Será que a energia da Sapucaí fez baixar um espírito de bicheiro em sua Excelência? Particularmente, duvido que o faça. Mas, como tem bicho no meio, o ideal é abrir as apostas.

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