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CNJ dará um basta?

Nepotismo deixa Poder Judiciário em maus lençóis

Publicado

Autor/Imagem:
Mário Camargo

O Poder Judiciário, que dividiu por muito tempo com as Forças Armadas a condição de instituição mais respeitada pela sociedade, já não está tão assim nas graças do povo. O vazamento e divulgação de conversas entre magistrados e membros do Ministério Público tem colocado muita gente contra a parede. É uma lista que vai de juízes a ministros do Supremo Tribunal Federal.

Mas há outras conversas, ainda guardadas a sete chaves, que, se divulgadas, jogariam a justiça definitivamente na lama. Nesse caso específico, sem vinculações com a Lava Jato, Rachadinhas, Mensalão, Petrolão e outras questões. O foco em discussão é o crescente nepotismo, tema sobre o qual o Conselho Nacional de Justiça tem se debruçado sem, contudo, chegar a uma conclusão.

A situação atual, na avaliação de juristas, pode riscar do mapa a famosa tese segundo a qual a Justiça tarda, mas não falha. O temor é o de que falhe. E a hora, como diria o Barão de Itararé, é de desfazer os nós que fazem o Brasil andar para trás. Os próximos oito dias – desta sexta, 26, ao próximo dia 6 – serão decisivos para o CNJ mostrar que a onda de moralidade existe e veio para ficar. O momento, portanto, é de saber se o Conselho vai bloquear o nepotismo ou dar o mau exemplo da torneira aberta.

A título de recordação, vale pontuar que a Rede Pelicano Brasil de Direitos Humanos denunciou o caso da interina da 1º zona de registro de imóveis de Caxias do Sul, Mariângela Rocha Nunes, indicada por Ivana Rosário de Castilhos, filha do antigo titular. A defesa apresentada por Mariângela Rocha Nunes é confusa, conforme relata o voto proferido pela conselheira Candice Lavocat Jardim:

“[…]Os requeridos, por sua vez, destacaram que a substituta mais antiga da serventia, na data de vacância, possuía vínculo de parentesco com o antigo titular e, por isso, com a edição do Provimento CN 77, sua nomeação na condição de interina foi tornada sem efeito. Assinalaram que a Sra. MARIANGELA ROCHA NUNES era empregada do cartório e exerceu a substituição em diversas oportunidades.”

O caso em julgamento levou a uma série de questionamentos aos conselheiros do CNJ. Há pontos que precisam ser esclarecidos, a saber:

Se existia a obrigatoriedade de esgotar a lista de substitutos ou de escreventes mais antigos que tenham exercido a substituição em períodos esporádicos, antes de seguir o Provimento CNJ 77/2018, então, como fica a situação dos interinos que tiveram cessada a nomeação com base e fundamento (teoria dos motivos determinantes) na aplicação do Provimento CNJ n. 77/2018? Eles serão reintegrados ou reconduzidos?

Os atuais interinos nomeados com base no Provimento CNJ n. 77/2018, serão destituídos para seguir a ordem de nomeação estabelecida neste procedimento de controle administrativo?

Cabe pedido de indenização por danos materiais e morais por parte de interinos que perderam a função com base no Provimento CNJ 77/2018?

Será comunicado aos Tribunais dos Estados para anularem as nomeações de interinos com base na ordem que está sendo estabelecida neste procedimento de controle administrativo?

Será editado algum ato normativo estabelecendo uma nova ordem preferencial de nomeações dispondo sobre a figura do substituto mais antigo do interino que deve ser nomeado em detrimento de delegatário concursado?

O Provimento CNJ n. 77/2018, será alterado com base na decisão que está sendo elaborada neste procedimento de controle administrativo?

Poderia o Conselho Nacional de Justiça estender a aplicação da regra do nepotismo ao serviço extrajudicial através de Provimento? Não seria necessário uma lei ordinária?

O caso é polêmico. O Tribunal de Justiça de Pernambuco, em uma das denúncias apresentadas pela Rede envolvendo a interina de Camaragibe, afastou os efeitos do Provimento CNJ 77/2018, fundamentando a decisão no fato de que o Conselho Nacional de Justiça é um órgão meramente administrativo.

Da mesma forma, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais concedeu liminar a diversos interinos que fundamentaram o seu pedido, também, com base no fato de que não cabe ao Conselho Nacional de Justiça atuar como legislador positivo e o caso de nepotismo deveriam ser tratados em lei ordinária a ser editada pelo poder de iniciativa do Poder Judiciário.

A situação é complexa e o Provimento CNJ n. 77/2018, como bem disse o conselheiro Rubens Canuto, foi editado com a finalidade de estabelecer critérios objetivos quanto a designação de interinos para responderem pelos serviços de notas e de registros vagos.

Canuto pontua que esse ato normativo, “em atenção aos princípios da moralidade, da impessoalidade e da eficiência, entre outros, criou uma ordem preferencial para tais designações”. Essa ordem preferencial, com o julgamento do caso de Caxias do Sul, será “quebrada” e o Provimento CNJ 77/2018, terá que passar por alterações, ou então, ser revogado.

Com relação ao julgamento do caso, o conselheiro Mário Augusto Figueiredo de Lacerda Guerreiro votou contra Candice Lavocat Jardim. Para isso, fundamentou seu voto no seguinte argumento:

“[…]A situação do interino não concursado é excepcionalíssima e admissível tão somente na absoluta impossibilidade de que algum delegatário concursado possa assumir a função, ainda que em cumulação provisória. Apenas nessa hipótese extremamente residual é que se admite essa forma não republicana de exercício de função pública.”

Republicano ou não, é preciso bater na tecla e lembrar que o caso faz o Barão de Itararé querer sair do túmulo e colocar ordem na casa. Até porque, como ele dizia, “o Brasil é feito por nós. Está na hora de desatar esses nós”.

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