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Vergonha nacional

Prisão de Milton incendeia o Planalto e mito de barro vira cinzas

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Junior* - Foto de Arquivo

E a verdade chegou para todos, inclusive para aqueles que não precisam de verdades, pois, como não são verdadeiros, acreditam no que há de pior no ser humano: a mentira deslavada. E assim foi feita a Justiça do Deus que realmente está acima de tudo e de todos. O pregador da honestidade única dos seus, da probidade inquestionável de quem indica e da deslealdade com as leis, botou a cara no fogo pelo pastor e ex-ministro Milton Ribeiro e acabou queimando muito mais do que o rosto. Sapecou as mãos, chamuscou a palavra, inflamou a campanha de candidatos com poucas chances de crescimento, afogueou o Congresso, incendiou o Judiciário e parece ter calcinado de vez sua já claudicante reeleição.

O resumo da ópera é simples: a falência total e definitiva do discurso anticorrupção. Acabou a cantilena dos santinhos do pau oco contra a desonestidade, desavergonhamento e indecência alheia. E agora, José? Aliás, a indagação precisa ser feita na ordem direta. E agora, Jair Messias? O que dizer para seu eleitorado menos crédulo? E para aqueles que sempre tiveram dúvidas do que ouviam sobre o governo terrivelmente evangélico? Sei o quanto será difícil mostrar para o gado fanatizado que, como seres humanos, todos nós somos passíveis de erros. O ideal é que não os rejeitemos. Fingir que não erramos é o caminho mais tortuoso. Um dia a casa cai. No outro, é o palácio que desmorona.

Nesse caso, a vergonha nacional é muito mais eloquente do que o eventual erro. E foi para o mestre dos mestres da Esplanada dos Ministérios, principalmente porque veio à tona uma série de frases de efeitos defeituosos, entre elas a de que é ele – mais ninguém – o responsável por tudo que ocorre no ministério. Tudo indica que deixou de ser após a prisão do reverendo Milton Ribeiro. Dias tenebrosos e de muitos temporais despontam para sua excelência. Nos meus devaneios mais primitivos, já consigo imaginar o desapontamento dos que são capazes de se imolar para salvar a surrada imagem da divindade do cerrado, cuja crença é que somente Deus teria o poder de tirá-lo da Presidência da República.

Pois bem, o pedido está bem próximo de ser atendido. Está chegando o dia. Considerando que o Criador deles não é único, pois é sempre imaginado menos benevolente com os antagônicos, mostrar para esse povo que Deus tem muito mais com o que se preocupar não será tarefa das mais fáceis. Ou seja, mesmo com evidências gigantes e gritantes do pastoreio do dinheiro público nas barbas do profeta, é possível a impossibilidade de provar para eles que o mito é mesmo de barro. Está mais do que claro que tanta clareza ainda é insuficiente para transformar em duende o defensor de pastores preocupados exclusivamente com o dízimo oficial, isto é, com a boquinha. Mas, acredito, que a sorte está definitivamente lançada.

Por razões óbvias, na tarde e noite dessa quarta-feira (22) ouvi em lares distintos do condomínio onde moro uma canção atemporal do falecido sambista Bezerra da Silva, denominada Pastor trambiqueiro. Composta em 1989, a letra tornou-se atualíssima no governo do tenente, recebendo as bençãos do ex-ministro da Educação. Certamente muitos brasileiros gostariam de ter participação da composição que explica o conluio de pastores de variadas congregações com o poder, sobretudo com o do din din, o famigerado e rico dinheirinho do povo que passa fome, não tem emprego, mas é obrigado a contribuir, sob pena de ser mandado para o inferno sem baldeação. É esse povo que chamamos de terrivelmente evangélicos? Certamente que não.

Os verdadeiros evangélicos, cristãos como eu, tementes a Deus, são sérios, solidários, realmente honestos, trabalhadores e abominam a necessidade de afrontar outras correntes religiosas. Esses não merecem novamente ouvir, 33 anos depois, o alerta de Bezerra da Silva. Além de ainda mais atemporais em 2022, os versos são autoexplicativos: “…Cuidado com ele, de terno e gravata bancando o decente/É o Diabo vivo em figura de gente/É o pastor trambiqueiro enganando inocentes/Não é fé que ele tem/É simplesmente a febre do ouro/Custa caro a a palavra de Deus/O pastor chega pobre e arrruma tesouro…” É ou não uma vergonha? Parto agora para a Pasárgada ou espero José se pronunciar? Como sei que ele nada sabe do que irá dizer, melhor esperar outubro chegar. Santo Antônio, São João e São Pedro já acenderam a fogueira. O foguetório ficará por conta dos que se salvarem desse desastre chamado governo.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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