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O dia dela

Rainha do Nordeste, jaca premia os destemidos que se arriscam para colhê-la

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Autor/Imagem:
Paulus Bakokebas - Foto de Arquivo/Freepik

No calendário das celebrações mais excêntricas e saborosas do mundo tropical, o 4 de julho não pertence apenas aos fogos de artifício norte-americanos. Não. Esse dia, no coração da natureza exuberante, pertence à soberana do aroma, à rainha dos trópicos, à explosão de doçura e pegajosidade: a jaca.

Sim, a jaca tem seu dia. E que dia glorioso para reverenciar uma fruta que não se contenta em ser discreta. A jaca é como aquelas tias festeiras que chegam antes da hora, perfumam a sala inteira e ainda deixam lembrança no ar muito depois de irem embora. Seu cheiro — que alguns ousam chamar de forte, mas que os iniciados sabem ser o prenúncio de um deleite — antecipa o banquete.

Há quem diga que a jaca é do tipo “ame ou odeie”. Discordo. A jaca é do tipo “mole ou dura”. Dois estilos, duas filosofias de vida. A jaca mole, mais sensível, de textura macia, que se entrega com facilidade, lambuza as mãos e o coração. A jaca dura, por sua vez, exige mais do paladar, mais da mandíbula, mas recompensa com um sabor encorpado, quase elegante. Ambas são rainhas, como gêmeas com personalidades opostas, mas igualmente irresistíveis.

E que fruto democrático! Pode ser degustada in natura, virada em doce de jaca, em compota, em chips crocantes, e — pasme, gourmet — até em receitas vegetarianas como “carne de jaca”, substituindo o porco no famoso “jaca-lhau” ou no “jacarrete”. Um manjar, um escárnio aos céticos.

A origem da jaca é nobre: nasceu nas florestas do sudoeste asiático, especialmente na Índia e Bangladesh, de onde se espalhou feito ideia boa, plantada com fé nas terras férteis do Brasil colonial. Os portugueses, curiosos por natureza e famintos por novidade, trouxeram-na para cá, e ela se sentiu em casa — afinal, o calor, o solo e o povo acolhedor não poderiam ser mais convidativos.

Hoje, ela reina sobretudo no Nordeste, mas sua presença é notada em qualquer feira brasileira que se preze. Ali, à sombra da lona colorida, entre gritos de oferta e o tilintar das balanças, a jaca repousa como um monumento tropical, exibindo seus espinhos macios e sua casca imensa, escondendo dezenas — às vezes centenas — de gomos dourados cheios de vitamina A, C, potássio, magnésio e fibras. Uma farmácia natural envolta em doçura.

Há até quem se recorde da infância pela jaca. Escalar a jaqueira era quase um rito de passagem — e também uma prova de coragem, já que basta um vacilo e a fruta despenca com a força de um tijolo perfumado. A jaca não perdoa distraídos. Mas recompensa os destemidos com um prêmio suculento.

No Dia da Jaca, façamos então silêncio por um instante. Respeitemos sua majestade pegajosa. Limpemos as mãos, descascando o preconceito. E comamos com gosto, porque há poucos prazeres tão simples e tão completos quanto afundar os dentes em um gomo de jaca madura, sentindo o sumo escorrer pelo canto da boca e o tempo parar por um instante, só para a fruta sorrir de volta.

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