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Estelionato Amoroso (II)

Sarah, desamparada, cai na rede do sedutor

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Reprodução

Um séquito considerável dava o último adeus ao finado marido de Sarah, enquanto esta, totalmente desolada pela perda, era amparada por amigos e familiares. Foi justamente nesse ambiente tristonho que entrou Arnaldo. Ele observou o lugar e, com a maior desfaçatez, foi direto para o caixão. Encarou o defunto como se o conhecesse de longa data e, sem qualquer esforço, enxugou uma lágrima providencial que escorreu pela sua face deslavada.

A viúva, sentada logo ali, não deixou de notar aquela figura estranha até então. No entanto, tão distinto era o cavalheiro, que se deixou levar por devaneios, ainda mais quando Arnaldo depositou um lírio sobre o morto. Ela, apesar de nunca tê-lo visto, teve certeza de que já o conhecia, bem como ouvira falar muito bem dele pela própria boca do marido.

Arnaldo, que de vez em quando se surpreendia com a sua capacidade de convencimento, foi até Sarah, que já o olhava como se fossem amigos de longa data. Talvez para não contrariar a viúva, os presentes cumprimentavam aquele estranho com a maior naturalidade. Ele pegou a mão direita de Sarah e a levou até seus lábios dissimulados. Disse palavras que a mulher queria ouvir, enquanto a encarava, com o intuito de hipnotizá-la. Nem precisava de tamanho esforço, pois a viúva já parecia totalmente envolvida por aquele homem de aparência tão digna.

– Desculpe, sei que já nos conhecemos, mas não me recordo do seu nome.

– Arnaldo Carvalho, às suas ordens.

– Sim, isso mesmo! O Afrânio me falava muito bem do senhor.

A conversa durou alguns minutos, até que Arnaldo teve certeza de que havia fisgado a velha. Ele tirou um cartão do bolso do paletó e o depositou nas mãos trêmulas de Sarah. Ela apertou aquele pequeno pedaço de papel e, tímida, o guardou em sua bolsa. Arnaldo se afastou e foi para o canto oposto, de onde poderia entender melhor as relações do falecido com aquela gente. Sentimentos sinceros, mas também abutres se engalfinhavam ao redor do féretro.

Após quase duas horas daquelas lamúrias, eis que a desolada mulher autorizou o enterro. Arnaldo, atento a tudo, logo se postou ao lado esquerdo do caixão. Fez questão de pegar a alça dianteira e, com a ajuda de mais cinco cavalheiros, ergueu o caixão em direção à cova. Aquele gesto não passou despercebido por Sarah, que, mesmo chorosa, se sentiu confortada por tamanha devoção de um fiel amigo do falecido se fazer presente durante a dolorosa partida.

O ataúde foi cuidadosamente depositado no fundo da tumba previamente preparada. Depois das rezas e com o consentimento de Sarah, o coveiro pegou a pá e colheu uma boa quantidade de terra. No entanto, antes que o homem prosseguisse, Arnaldo tomou-lhe a pá e, ele mesmo, depositou aquele conteúdo sobre o caixão do morto. Em seguida, sem se virar para o coveiro, entregou-lhe a pá. Seus olhos se mantinham conectados aos de Sarah, e assim se prosseguiram até que todos foram se dispersando. Arnaldo, com um leve aceno de cabeça, se despediu da viúva e foi embora, certo de que logo se veriam novamente.

O capítulo III será publicado na quinta, 18

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