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Defender o quê?

Sonho de menino vira pesadelo, mas a esperança continua viva

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto Reprodução das Redes Sociais

Nesse dia que já foi festivo e de reuniões cívicas e verdadeiramente patriotas, não posso deixar passar em branco o desejo de alguns questionamentos sinceros. Talvez eles estejam mais para sincericídios, mas tenho de fazê-los, antecipadamente pedindo perdão aos fanatizados defensores do senhor dos anéis. Você que vai para a rua neste 7 de setembro, Dia da Independência, defenderá o quê? Será o aumento da fome, do desemprego, da gasolina e e da inflação? Ou será a impunidade do presidente e de sua nobre família? Considerando que a moeda dos defensores do presidente da República só tem um lado, a razão das perguntas é bastante óbvia e vai ao encontro de algumas afirmações que recebi no zap ao longo do fim de semana. Considerando também que o passar o tempo me desobrigou das respostas politicamente corretas, adianto que concordo integralmente com todas.

Entre as assertivas mais interessantes, a mais longa foi justamente a mais interessante. “Se você é um patriota que vê o Brasil acima de tudo e Deus acima de todos, se você vê sua liberdade ameaçada por ministros da Suprema Corte, se você acha que os líderes do país não conseguem cumprir suas missões por interferência do Congresso e do Judiciário e, principalmente, se você quer lutar contra a ameaça de comunista, procure ajuda profissional. Você apresenta sérios problemas de dissonância cognitiva e /ou alucinações”. Perfeito, corretíssimo, mas certamente tenebroso para os integrantes daquele grupo que ama dizer o que quer, mas odeia ouvir o que não quer. Dois dias depois de protagonizarmos o maior escândalo do futebol mundial, estamos a um passo da guilhotina política com a transformação do 7 de Setembro em festa golpista.

Aproveitando a oportunidade para reiterar minha posição de democrata, ratifico minha repulsa por ter de assistir essa nova peça absurda do teatro sujo do ator mambembe que se instalou no palco do Planalto. Tudo culpa do tempo. A idade trouxe a experiência do homem, mas matou a ingenuidade e os sonhos do menino. Eu me imaginava grande quando, levado por meus pais, assistia aos desfile escolares e militares do Dia da Independência. Era uma data cívica e familiar, embora fosse obrigado a ouvir à exaustão a Ordem do Dia dos generais da época. Era uma demonstração real de força, ainda que velada. Nada como hoje, quando a força é imaginária, mas a demonstração é real. Quanta saudade do tempo em que havia brasilidade entre os brasileiros.

Tudo bem que aquele tempo foi um momento repleto de fantasias. Talvez “estórias” de uma época que pensei trazê-las para o tempo presente, mas, após rápida leitura nos principais sites de notícias, rapidamente me convenci da impossibilidade disso. As boas memórias e felizes lembranças ficaram lá atrás, período em que até as coisas ruins eram melhores do que as de hoje. Da inquietude de menino travesso e ávido pelo aprendizado restrito aos mais velhos, consequentemente mais sábios, restou a clássica saudade da melhor crônica da vida. No vigésimo-primeiro ano do século 21, vivemos somente de recordações e de reminiscências. Como nos versos de Maciel Melo no poema musicado Nos tempos de menino… era a vida que eu queria e do jeito que eu sonhava. Nunca era tarde nem cedo, meia noite ou meio dia”. A verdade é que cansei de correr atrás. Agora vou deixar o tempo decidir o melhor para nós.

Apesar das profecias de pastores evangélicos, que profetizam o apocalipse para convocar fieis para atos neste de 7 de Setembro, não esqueçamos jamais que a data não pertence a grupos, tampouco é base para projetos escusos, espúrios, malucos e apologéticos. Sabemos todos que o melhor está por vir. Deveria ser uma festa de resgate do civismo e do fortalecimento do patriotismo, mas o mito e seus seguidores preferiram usá-la como motivação política e como tentativa de retorno ao jugo militar. O argumento é que os avessos ao bolsonarismo são comunistas. Não sou, mas, se fosse, diria que o “camarada” Xi Jinping, considerado comunista pelo capitão brasileiro, pode ser tudo, inclusive comuna, mas é muito mais inteligente do que a média dos governantes mundiais e muito mais do que o nosso.

A prova é que, mesmo com cerca de 1,5 bilhão de habitantes, o país que ele governa caminha celeremente para o título de maior economia do mundo. Enquanto isso, o Brasil faz dois anos e sete meses não sai da mesmice. Passados quase 200 anos do grito de Pedro I às margens do Ipiranga, é chegada a hora de a esperança novamente vencer o medo e o ódio. Por isso, rogo a Deus para que os ventos da paz empurrem definitivamente a incoerência, a insensatez e a ignorância para o fundo do Lago Paranoá. Outrora centro de um poder democrático e futurista, o Palácio do Planalto não pode ser transformado em quartel general de arruaceiros, tampouco de milícias.

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