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Saco nas costas

Trabalhar sem reconhecimento é pior do que labutar sem prazer

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto Reprodução

O trabalho é algo presente na vida da maioria dos indivíduos e tem uma grande diversidade de categorias, cada uma devendo ser valorizada e respeitada. É no ambiente de trabalho em que boa parte das pessoas passa muitas horas de seus dias, buscando, por meio de suas atividades, atingir metas e alcançar sonhos. Trabalhe por uma causa, não por aplausos. Labute para expressar o melhor de você, não para impressionar. Labutar é a palavra de ordem. Você nunca sabe que resultados virão de sua ação. No entanto, se você não fizer nada, não existirão resultados. Hoje, dia 1º. de maio, é o Dia do Trabalhador e do Trabalho. No popular, é um dia como qualquer outro. A diferença é o prazer. Sentir prazer no que faz torna o trabalho perfeito.

Meu amigo Bilau sempre trabalhou duro. Carregou saco nas costas, mas, mesmo velho, jamais esqueceu o deleite no momento do regozijo. Considerando que todo prazer é erótico, o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesmo. Como metade do mundo não consegue compreender os prazeres na outra metade, temo ter perdido meus dias na volúpia. Grandes deuses, se isto ocorreu, devolvei-los a mim para que eu volte a perdê-los. Sem trabalhar duro não chegarei lá. Por isso, endosso a luta do amigo Bilau, que aproveitando do Dia do Trabalho, resolveu redigir um leque de reivindicações ao chefe imediato, também conhecido nas filas do banheiro da empresa como Dr. Balan Gandãs.

Obviamente que a primeira exigência foi salarial. No documento encaminhado ao chefrudo, Bilau informou que as cobranças eram baseadas nas seguintes razões: Faço esforço físico no cumprimento de minhas funções; trabalho em grandes profundidades; mergulho de cabeça em tudo que faço; não descanso nos fins de semana ou feriados nacionais; trabalho em ambiente extremamente úmido; não recebo horas extras; trabalho em ambiente sem iluminação e sem ventilações adequadas; trabalho sob altas temperaturas, sem climatização; e meu trabalho me expõe as doenças contagiosas.

Mole feito um prato de papa quente, Dr. Balan Gandãs não assume nada. Por isso, de imediato repassou a pauta à chefe do Recursos Desumanos (RD), Dra. Ximbica Bacana. A resposta foi grossa e rombuda. Na primeira página, a empavonada senhora, cujas partes eram a cópia escarrada de um capô de fusca, respondeu: “Sr. Bilau, após a revisão de seus pedidos, e considerando seus argumentos, o Dr. Balan Gandãs, ensacado por toda a diretoria, rejeitou suas reivindicações, baseando-se nos seguintes fatos: o sr. não trabalha oito horas ininterruptas; dorme durante o expediente, após curtos períodos de trabalho, em visível demonstração de ‘corpo mole’; nem sempre segue as ordens da gerência, e costuma visitar outras repartições”.

Antes mesmo de chegar à página 2 e dar a notícia a seu Pinto, assessor de Bilau para assuntos aleatórios, percebi que a vaca tinha ido para o brejo. Ainda mais dura e grossa, a diretora continuou: “Como dizia, sr. Bilau, pela sua idade, normalmente lhe falta iniciativa; o sr. precisa ser estimulado e pressionado para começar a trabalhar; deixa seu ambiente de trabalho bagunçado, ao fim do turno; raramente observa as normas de segurança de trabalho, e, por vezes, abre mão de seu Equipamento de Proteção Individual (EPI). Ou seja, não veste a correta roupa protetora. Por fim, adianto que o sr. se aposentará muito antes dos 65 anos”. Triste, meio molenga, cabisbaixo e demasiadamente complexado com a incontinência urinária que acomete os que já passaram dos 32 anos, meu parceiro de várias jornadas noturnas achou que era melhor parar.

No entanto, lembrando dos velhos tempos de macho alfa endurecido apenas pelo tato, ele se sentiu na obrigação de tomar a carraspana – na verdade, uma trolha sem lubrificante – até a última linha. No fim da página 2, mais uma porrada: “O sr. é incapaz de trabalhar dois turnos dobrados”. E não adiantou informar que a ronda antiga era de oito por hora. Tudo bem que hoje é uma a cada oito horas. Meu Deus, que radicalismo patronal. Na página 3, veio a extrema unção: “Como atender quem abandona a posição de trabalho antes de completar a tarefa ou quem, logo após iniciar a jornada, passa mal e vomita, ou simplesmente desmaia. E se tudo isso não bastasse, temos observado o sr. entrando e saindo do local de trabalho carregando sempre um saco de aparência suspeita”. Caramba, Bilau foi pego no engasgo. As donzelas que o perdoem, mas ele mantém o bordão para as mais idosas: “Se você gosta de um kombucha bamba, prometo levá-la à loucura. Feche os olhos e embarque nessa viagem sem volta” Vá fundo, meu grande amigo Bilau. Sobre o Dr. Balan Gandãs, continua de pé, mas com ajuda sistemática da lamparina. Como de bacana Ximbica tinha muito pouco, e acabou morrendo velha e enrugada.

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