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Vendedor de sonhos

Verdade nua e crua. De eleitor e louco, brasileiro tem um pouco

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Junior* - Foto de Arquivo

O maior líder da história da humanidade nos ensinou que a humildade nos faz grande. Entretanto, desde que o mundo é mundo normalmente optamos pelas palavras em detrimento das ações. Embora nem sempre seja imediato, o resultado invariavelmente é devastador, no mínimo com algumas sequelas malditas e duradouras. Não imaginei nenhum preâmbulo filosófico, mas resolvi começar a narrativa de hoje tentando mostrar algumas máximas que, voluntária ou involuntariamente, esquecemos ao longo da vida. Refiro-me às regras da natureza, as quais nos mostram diariamente que os rios não bebem sua própria água, tampouco as árvores comem seus próprios frutos ou o sol brilha para si mesmo. Aplicando essas teóricas teses à sociedade civil, às relações afetivas e de amizade e, sobretudo à política, a prática nos mostra que, via de regra, esquecemos que a vida é muito melhor quando os outros estão felizes por nossa causa.

Resumindo todo esse blá blá blá, quero dizer que nem tudo que é bom para mim ou para você é bom para a coletividade. Às vezes, numa vã tentativa de mostrar insatisfação com determinada coisa, pessoa ou gesto, assumo posições contrárias aos meus pensamentos religiosos e até ideológicos. O arrependimento é tão rápido como a decisão. Buscando especificamente o viéis político, lembro que as escolhas democráticas de uns podem afetar profundamente a história de outros. O problema é quando os “outros” se transformam em maioria absoluta logo após os primeiros dias, semanas ou meses do governo de “uns”. Respectivamente, os cariocas, mineiros e brasilienses já foram governados pelo gaúcho Leonel Brizola, pelo piauiense Francelino Pereira e pelo goiano Joaquim Roriz. A satisfação de “uns” e o pesar de “outros” está nos livros.

O problema cresce de proporção quando o micro vira macro. O ex-caçador de marajás Fernando Collor de Mello é o grande exemplo de que as flores não espalham sua fragrância para si. “Uns” ganharam dos “outros” e o resultado foi o que se viu. Pior ainda é o resultado que estamos vendo e vivenciando. É claro que cada um escolhe conforme sua predileção ou loucura. Por isso vivo numa democracia. E, apesar dos pesares, quero permanecer com ela. Meus queixumes são simplórios. É verdade que lamentei, mas respeitei o voto alheio. Então, o mínimo que peço é que o alheio respeite meu direito constitucional de criticar ou condenar a preferência eleitoral de “uns”. Nada mais do que isso. Toda essa lenga lenga é para chegar onde desejo: no governo eleito por “uns” apenas por desgosto, desconforto ou decepção com o governante de “outros”.

Ou seja, novamente o eleitorado vitorioso partiu do nada e agora, dois anos e nove meses depois, percebeu que chegou a lugar algum. São ou não são as loucuras nossas de cada dia? Nesse torrão louco chamado Brasil há um pouco de Machado de Assis em cada um de nós. Em alguns, Machado de Assis está de corpo inteiro. Em uma sátira magistral, o escritor carioca, por meio do personagem Simão Bacamarte (O Alienista), desafia o brasileiro comum a delimitar o campo daquilo de que se entende por loucura. Com base no provérbio popular de médico e louco todo mundo tem um pouco, está claro que não há resposta viável ou lógica para o indicativo de insanidade. Nessa louca e desproposital narrativa, também vale a pena citar o escritor e psiquiatra Augusto Cury, autor do romance De gênio e louco todo mundo tem um pouco, cujos personagens (uma continuação do Vendedor de Sonhos) semeam sonhos em busca de um mundo melhor.

No Brasil de nossos dias, quando o desgoverno é um fato, tenho de me regrar pelas instituições de controle impostas pela sociedade. São elas que estabelecem minha forma de agir, falar, comportar e vestir. Enfim, como ser “normal”. Se não me ajusto, sofro sanções, sou louco e até desajustado. Sou visto dessa forma somente porque não entendo como saudáveis mandatários que negam seu próprio povo. É aquela velha história de que há loucos que se olham no espelho e se acham normais. E daí? São perfeitos e ponto final. Gostaria de registrar que sou louco apenas por frases de efeitos e pensamentos que refletem a loucura do Brasil de hoje. Paro, reflito e lembro do físico alemão Albert Einstein: “Às vezes não sei se o louco sou eu ou se são os outros”.

Respondo com o pensamento do filósofo prussiano Friedrich Nietzsche: “Antes ser louco por meu próprio critério, do que sábio segundo a opinião dos outros”. Dito de maneira mais simples, faço minhas as palavras do poeta Raul Seixas, para quem “A arte de ser louco é jamais cometer a loucura de ser um sujeito normal”. Os livros e os conceitos podem não ser sinceros, mas as pesquisas…Essas são reais e nunca mentem. Ainda que, por necessidade da alma, busquemos a consciência, a compreensão e o raciocínio ilógico dos loucos. Em 2018, as urnas mostraram que os normais votaram com tanta loucura que acabaram deixando mais loucos os loucos por mudanças na política nacional.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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