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Retrato do Brasil

Um rei que pensa ser juiz, ou juiz que sonha ser rei?

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Luis Carlos Alcoforado

A decretação de prisão antes da citação do réu para o exercício de seu direito de defesa sugere abominável vocação totalitária, fora de qualquer compromisso institucional, com inspiração no terror do Estado ou estado de terror.

Antes da defesa, o castigo da barbárie é incomunicável com a civilidade, porque fruto de voluntarismo personalíssimo, mas disfarçada sob a égide de comando estatal.

O poder de julgar se violenta na comunicação com o justicialismo vulgar, como se a sociedade dispensasse a imparcialidade da Justiça para a afirmação de uma decisão judicial como elixir à sobrevivência da sanha utilitarista do julgamento popular.

Bastam urros coléricos para a consciência deformada do Estado-juiz consagrar o virtuosismo da punição, sem defesa.

A defesa deixou de ser direito natural e universal para se transformar em mera eventualidade ideológica do aparato que comanda o poder revolto de um Estado perdido entre a institucionalidade e a justicionalidade, num ambiente em que a justiça dialoga com seu próprio fracasso.

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A injustiça da prisão reclama superação pela justiça de hoje, em cujo organismo recrutas abdicados fazem da teoria um laboratório de terror, com ímpeto voluntarista típico dos soldados aliciados para fidelizarem a consciência adormecida dos falsos heróis, depois severamente julgados pela História.

A liberdade consiste no essencial direito de indisposição contra o Estado, razão por que as franquias que asseguram o seu exercício se governam pelo irrefutável poder do cidadão em se confortar na garantia do princípio da presunção de inocência, indestrutível pelo prazer mórbido da fantasia do rei travestido de juiz ou do juiz que queria ser rei, como soberano absoluto e sem constituição.

No momento em que as excepcionalidades, anomalias e extravagâncias se identificam com o festejo popular, impõe-se o diálogo com o visionário para contornar a zona abissal em cuja escuridão o mundo mergulhou, ao sacrificar os inegáveis valores da Justiça em nome da atoleimada vocação fugaz do julgador algoz, tolhido pela aparente compreensão de que é demiurgo.

A Justiça é o imperativo da cidadania, mas não pode se converter em instrumento para aguçar a crise de identidade de seus valores mais caros e virtuosos, como se as circunstâncias justificassem o terror para corrigir os erros do passado.

Pensar no futuro é a melhor reflexão.

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