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Literatura

Carol lança seu ‘Clube dos Jardineiros da Fumaça’

Publicado

Autor/Imagem:
Guilherme Sobota

O terceiro romance da escritora gaúcha Carol Bensimon, O Clube dos Jardineiros de Fumaça, pode ser definido como um livro sobre as gerações que testemunharam a Guerra às Drogas – a política global fundada nos EUA no início dos anos 1970 que ainda é a narrativa dominante sobre a relação das sociedades com as substâncias, e no caso específico, a maconha.

Inteligente retrato da geração hippie e dos millennials, o livro, seu terceiro pela Companhia das Letras, é ambientado no condado de Mendocino, no norte da Califórnia, para onde um jovem professor gaúcho, Arthur, se muda em busca de uma nova vida e alguma paz de espírito. Lá ele aprende que praticamente toda a economia do local gira em torno do cultivo (até então ilegal) da planta – Mendocino faz parte do Triângulo da Esmeralda, região conhecida assim pelo formato das plantas de maconha.

A história se passa no momento anterior à legalização do consumo recreativo da planta na Califórnia, efetivada no dia 1.º de janeiro de 2018. Projeções indicam que o comércio de maconha legal nos EUA chegue a US$ 23 bilhões em 2021.

A autora – selecionada em 2012 pela Granta como uma das melhores jovens escritoras brasileiras, com livros publicados na Espanha, Argentina e agora nos Estados Unidos, em 2018 – usa com habilidade a economia da maconha como pano de fundo para compor um romance com personagens de pelo menos quatro gerações, cujos interesses entram em conflitos (às vezes involuntários) nas 360 páginas do livro.

Uma frase sobre uma personagem resume: “(Ela) não sabe onde começam os fracassos do seu filho e onde começam as limitações de toda uma geração azarada que está se tornando adulta em um mundo ultracompetitivo e economicamente instável”, diz a narradora.

Para a autora, o choque de gerações é uma questão global. “Claro que, em cada lugar, isso se dá com suas particularidades”, diz Bensimon, em uma troca de e-mails. “No caso de Mendocino, fica evidente que os fundadores da contracultura dos anos 60 não se sentem exatamente à vontade com as mudanças do condado, da Califórnia, do mundo: gentrificação, Airbnb, e, de modo geral, símbolos da contracultura sendo incorporados pelo mainstream.”

A economia que gira em torno da maconha acaba sendo um exemplo “perfeito” desse choque, segundo a escritora.

“A erva que eles cultivavam no jardim dos fundos agora movimenta bilhões de dólares e, com a legalização, ganha vitrines, embalagens perfeitas, torna-se um produto como qualquer outro” – e isso não ocorre porque o governo reviu suas posições históricas, mas sim porque a legalização vai movimentar muito dinheiro.

Ela decidiu ambientar seu terceiro romance na região americana depois de visitar o local em uma viagem de férias em 2014 – de lá para cá, voltou e estudou a dinâmica do local.

No livro, o personagem Arthur decide se mudar de Porto Alegre após um escândalo midiático que envolvia a produção caseira de maconha, para aliviar o sofrimento da mãe, em tratamento contra o câncer. Esta é uma questão pessoal de Bensimon. “Uma tia muito próxima morreu de câncer. Era bastante conservadora, mas, na época que estava doente, tentei falar com ela sobre a maconha, que alivia os efeitos nefastos da quimioterapia. Ela chegou a perguntar à oncologista sobre o assunto, que desaconselhou o uso Sempre fico pensando se poderia ter sido diferente, se minha tia poderia ter tido um fim de vida mais tranquilo.”

A escolha do pano de fundo salta aos olhos por não ser tão comum (Silviano Santiago, por exemplo, já havia ambientado, com sucesso, Stella Manhattan em Nova York), mas não é algo que preocupa Bensimon.

“Na história da literatura brasileira, não encontraremos nenhum autor livre de influência estrangeira, e é cada vez mais difícil, em um mundo globalizado como o de hoje, pensarmos em um todo coerente e nacional, o que seria, aliás, bem reducionista e altamente prejudicial à literatura”, acredita. “Na ficção que eu escrevo, os lugares têm uma importância crucial, e eu acredito, como o Wim Wenders (diretor alemão que filmou nos EUA, aliás), que não é possível inventar uma história e então situá-la em qualquer lugar: o lugar é parte integrante da história, ou talvez eu possa mesmo dizer que o lugar é a história.”

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