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Insistir na busca e achar ETs pode significar o fim da humanidade, afirma filósofo

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Se você sonha em ver de perto um alienígena, este tem sido um ótimo ano. Em junho, no aniversário de 46 anos do primeiro homem na lua, o empreendedor e filantropo russo Yuri Milner afirmou que irá investir US$ 100 milhões nos próximos dez anos no programa de pesquisa de sinais de vida alienígena, conhecido como Seti, fornecendo ao setor uma estabilidade financeira e um acesso a telescópios que nunca foi possível.

Na mesma semana, a Nasa anunciou a descoberta do que pode ser o planeta mais parecido com a Terra fora do sistema solar, o Kepler 452b, que fica a apenas 1.400 anos luz daqui.

Em uma conferência de imprensa após o anúncio de Milner, Geoffrey Marcy, caçador de planetas da Universidade da Califórnia, em Berkeley, destacou que “o universo parece estar repleto dos ingredientes necessários para a biologia”. Ele afirmou que apostaria a casa de Milner, avaliada em cerca de US$ 100 milhões, que existe ao menos vida microbiana em outros planetas.

Você pode até imaginar que a descoberta de micróbios em Marte ou de peixes nos oceanos de Europa, uma das luas de Júpiter, faria os cientistas pularem de alegria. E você provavelmente estaria certo. Mas nem todo mundo acredita que essa seria uma notícia tão boa. Ao menos um importante pensador acredita que isso representaria um “golpe esmagador”.

Trata-se de Nick Bostrom, filósofo da Universidade de Oxford, diretor do Instituto do Futuro da Humanidade e um dos grandes pessimistas da nossa era.

Em um artigo publicado em 2009 na Technology Review, Bostrom declarou que a descoberta do mais ínfimo micróbio na superfície marciana seria um sinal muito ruim para o futuro da humanidade. “Rochas e desertos sem vida me deixam muito mais feliz”, escreve.

Tudo começou em 1950 em Los Alamos, no Novo México, o local de nascimento da bomba atômica. O assunto eram discos voadores e viagens interestelares. O físico Enrico Fermi fez uma pergunta que ficou famosa entre os astrônomos: “Cadê todo mundo?”.

O fato de não existirem evidências de visitantes extraterrestres fora dos tabloides mais toscos convencia Fermi de que viagens interestelares são impossíveis. Demoraria tempo demais para ir a qualquer outro lugar. O argumento foi desenvolvido por cientistas como Michael Hart e Frank Tipler, que concluíram que civilizações tecnológicas extraterrestres simplesmente não existem.

A lógica é muito simples. Imagine que daqui a um milhão de anos os terráqueos lançassem um robô em direção a Alpha Centauri, o sistema solar mais próximo do nosso. Ele chega até lá em alguns anos e, milhões de anos mais tarde, envia sondas para dois outros sistemas solares.

Um milhão de anos depois, cada uma delas envia mais duas sondas. Levando-se em conta que essas espaçonaves viajam a velocidades generosas, em 100 milhões de anos seria possível visitar cerca de um nonilhão de estrelas (ou 10 elevado à 30 potência). A galáxia contém cerca de 200 bilhões de estrelas, o que significa que cada estrela poderia ser visitada mais de um trilhão de vezes, segundo a lógica desses robôs.

A ideia da sonda interestelar não é tão absurda, inclusive. Gente muito séria deseja enviar uma sonda para outra estrela por meio de tecnologias que serão possíveis em um futuro próximo. Um bom exemplo vem da Agência de Projetos de Pesquisa Avançada em Defesa e seu Estudo de Espaçonaves, previsto para durar um século.

Além disso, existem bilhões de planetas potencialmente habitáveis na galáxia. Se apenas uma pequena parcela deles desenvolver vida e tecnologias, isso seria o suficiente para transformar a galáxia inteira em uma verdadeira Times Square.

A Via Láctea tem 10 bilhões de anos. Portanto, cadê os alienígenas e todos os seus artefatos? A gente não achou nada. Se a vida é tão simples, alguém em algum lugar já deveria estar chamando. Esse é o famoso paradoxo de Fermi.

Existem muitas falhas nesse argumento, incluindo a possibilidade de que não seríamos capazes de reconhecer a vida alienígena, mesmo que estivessem bem na nossa frente. A explicação mais simples, segundo Bostrom e outros especialistas, é a de que não existem outras civilizações que resolveram viajar pelo espaço.

Ele acredita que deve existir alguma coisa que impede a vida de surgir, ou que limite sua permanência antes que ela seja capaz de chegar às estrelas. Ele se refere a isso como o Grande Filtro.

Dá pra imaginar todo tipo de gargalo na evolução da vida e das civilizações – desde a combinação dos primeiros átomos em cadeias de RNA, a molécula genética que é o fiel ajudante do DNA, até as guerras nucleares, as mudanças climáticas, erros na engenharia genética – que podem operar como um Grande Filtro.

Para Bostrom o que é mais difícil saber é se o Grande Filtro ficou no passado ou se está no futuro, e para obter a resposta ele olha para as estrelas. Se não existe mais nada aí fora, isso quer dizer que sobrevivemos ao mais difícil. Por mais bizarro que pareça, somos os primeiros em toda a vizinhança a chegar à corrida de obstáculos do cosmos.

Se tivermos companhia no universo, isso significa que o Grande Filtro ainda está em nosso caminho e que nossos dias estão contados.

Essa é uma informação extremamente existencial e que foi adquirida na flor da idade de nossa jovem espécie, com base no exame detalhado de uma pequena parcela de nossa vizinhança cósmica. Além disso, esse também é um exercício corajoso que estende os limites da razão humana.

Um exercício corajoso demais, mas que encontra precedente no antigo Paradoxo de Olbers, que recebe o nome de Heinrich Wilhelm Olbers, astrônomo amador do século 19 que descreveu um problema que incomoda os astrônomos desde pelo menos o século 16: por que o céu fica escuro durante a noite? Em um universo infinito e eterno, tudo deveria ser preenchido por estrelas e até mesmo nuvens de poeira cósmica brilhariam como o dia.

Pensadores como o físico escocês Lord Kelvin e o escritor Edgar Allan Poe sugeriram que a escuridão dos céus era uma pista do fato de que o universo seria finito, ao menos em relação ao tempo, e que tivera um começo, uma ideia cimentada pela teoria do Big Bang.

Se Olbers viu o início dos tempos, talvez Fermi e Bostrom tenham visto seu final. E isso não devia nos surpreender. Nada dura para sempre. Os pais do Seti, Carl Sagan e Frank Drake, destacavam que o principal elemento desconhecido em suas equações era o tempo médio de vida das civilizações tecnológicas. Se sua existência fosse muito curta, isso eliminaria a chance de duas delas existirem ao mesmo tempo. Esqueça a irmandade hipotética da galáxia. Os Klingons desapareceram há muito tempo.

O melhor que podemos esperar é que sejamos mais uma fase evolucionária no zigue-zague do desenvolvimento da vida na Terra como a conhecemos. Mas em alguns bilhões de anos, o Sol vai morrer, e o mesmo vale para a Terra e para nossos descendentes – caso eles ainda estejam por aqui. O universo não vai se lembrar de nós, nem de Shakespeare ou Homero.

Não podemos culpar Bostrom por isso. Mas ele tem um histórico de pensamentos desconfortáveis. Em 2003, defendeu o argumento de que nós provavelmente vivemos em uma simulação de computador, algo que seria muito simples para uma civilização “tecnologicamente madura”.

O que há de comum entre seus cálculos e outros que beiram a ficção científica é o fato de todos se basearem em extrapolações, seja a duplicação da capacidade de processamento decretada pela Lei de Moore, no caso das simulações computadorizadas, ou a duplicação das sondas espaciais ao longo dos milênios. Acredite por sua própria conta e risco. Os chips não podem encolher para sempre. Máquinas independentes que vagam muito longe de casa se quebram ou se esquecem de sua finalidade. A Apple não vai conseguir duplicar as vendas de iPhones para sempre.

Como grande biólogo e jornalista científico Lewis Thomas gostava de dizer, nós somos uma espécie ignorante. E é por isso que experimentamos tanto.

Dennis Overbye, New York Times

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