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Lava Jato só trouxe as carruagens a Brasília. Onde estão os cocheiros?

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Nos últimos anos do Século XVIII, segundo a direção de Stephen Frears em Ligações Perigosas, o filme, uma adaptação do Les Liaisons Dangereuses, o livro, a corte já dava sinais de que o jogo é bruto. No cinema a arquitetura para a sedução passa por alcovas onde eram negociados as traições e os subornos. Todo tipo de achaque e todo tipo de moeda poderiam ser encontrados em castelos onde estava instalada a nobreza.

A imprensa brasileira vem divulgando uma última versão do caso da Marquesa de Merteuil com o Visconde de Valmont a quem ela prometeu o reino, a alma e a carne. Só que o episódio aqui acontece em modernos palácios do Século XX. E a corte, aqui, nem faz muita questão da alma e da carne. Mas do reino não abre mão.

O jornal O Globo, em sua enésima matéria sobre a Operação Lava Jato, traz a denúncia do empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, sobre uma parcela dos recursos desviados da Petrobras que chegou a parlamentares e candidatos brasilienses. Os caminhos e as razões é que são para atores muito melhores que Glenn Close e John Malkovich, de Ligações Perigosas.

Sinopse do enredo: a construtora UTC superfaturava os contratos da Petrobras para repassar comissões aos agentes do Palácio do Planalto e da Petrobras. Esse é o primeiro capítulo, já lido e relido. Depois, mais recursos eram distribuídos a senadores e deputados em troca de pizzas nas comissões de inquérito instaladas no Congresso Nacional.

A UTC foi muito mal investigada na CPMI, ao que afirma Ricardo Pessoa, porque o ex-senador Gim Argello blindou a empresa. A operação teria custado R$ 5 milhões. Esse é o segundo capítulo.

A seguir, no período da última campanha eleitoral, Gim teria redistribuído as moedas a outros candidatos, entre eles, Liliane Roriz, eleita deputada distrital com a prestação de contas de que levou mais de um milhão de reais da UTC, ou seja, quase 100% do que declarou ao TER-DF. Gim Argello não foi eleito e a seguir tentou chegar ao Tribunal de Contas da União. Também não chegou lá. Mas a delação de Pessoa chega, sim, ao TCU, outro palácio da corte, onde parentes de ministros foram acusados de intermediar facilidades, mas ainda sem seus nomes divulgados.

Correndo por fora, Levy Fidelix, presidente do PRTB, enviou ofício para o gabinete de Liliane Roriz, exigindo o retorno do investimento que ele teria promovido para a sua campanha. Queria, inclusive, um punhado dos salários da CLDF para fazer de seu. Talvez tenha o crédito de ter dado o aval para a operação da UTC com Gim e dos royalties de seu Partido Renovador Trabalhista Brasileiro, de quem é dono nacional.

Só que Liliane atende a dois reis, porque em Brasília quem manda no PRTB é o ex-senador Luiz Estêvão, que exigiu do pai da parlamentar, Joaquim Roriz, que ela disputasse a eleição usando o crachá do partido de Fidelix. Sobre o irrisório valor de 5 milhões, Estêvão afirma que nem conta uma soma tão pequena como essa e que não sabe de nada.

O enredo é de tirar o fôlego. Na trama local ainda não apareceram os atores coadjuvantes, que são poucos porque as operações são, digamos, de confiança. Essas movimentações não acontecem por meio dos protagonistas. Estes só combinam as fronteiras do reino, mas quem pilota as carruagens de valores são os conhecidos operadores, reunidos em palácios menores, fora do perímetro da Esplanada dos Ministérios. Viscondes e marquesas degustam um bom vinho enquanto conspiram uns contra os outros. E aguardam que seus cocheiros anônimos anunciem, utilizando senhas reais, que os baús chegaram em segurança aos seus destinos. Ser operador do reino não é fácil não…

Nas alcovas dos modernos palácios de Brasília, públicos e privados, os cocheiros são facilmente identificados. Até no Buriti de Rollemberg são vistos disputando vaga de carruagem. Se eles viessem a falar, aí sim, as nossas cortes estariam em maus lençóis. Nada diferente do Século XVIII. No dia 16 próximo um novo episódio entra em cartaz e novos personagens podem estrear. Vale a pena comparecer à esquina mais próxima.

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