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Musical

Madame Satã sobe aos palcos para combater homofobia

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Igor Giannasi

O ator, cantor e compositor mineiro Rodrigo Jerônimo – agora também dramaturgo e diretor – considera que não estamos passando por um momento de “meias-palavras”, especialmente em se tratando de racismo e LGBTfobia. E exemplifica com o fato de o Brasil ser o país onde mais se mata transexuais. Por isso a reflexão sobre a violência e o preconceito que permeiam esses temas é o que propõe o Grupo dos Dez com o musical Madame Satã, que faz curta temporada em São Paulo.

“É um espetáculo político e poético, que coloca ao sol questões que são muito óbvias para quem sofre, mas que no geral passam despercebidas pela maioria das pessoas que não sofrem tais opressões”, diz Jerônimo, que assina o seu primeiro texto teatral em parceria com Marcos Fábio de Faria.

A companhia de Belo Horizonte faz um paralelo entre a biografia de João Francisco dos Santos (1900-1976), negro, pobre, nordestino, homossexual e travesti que se tornou uma figura mítica da boemia da Lapa carioca no início do século 20 e as recentes situações de discriminação contra grupos marginalizados na sociedade. Jerônimo conta que, por exemplo, em determinada cena o texto do espetáculo se apropria do discurso atual proferido por um deputado homofóbico na fala de um personagem que ataca Madame Satã.

Para chegar ao tom ideal na dramaturgia, Jerônimo teve a contribuição do diretor João das Neves, um dos fundadores do icônico Grupo Opinião, que nos últimos anos trabalha com a companhia. “O que mais me impressiona nele é conseguir debater temas tão difíceis e tão onerosos para a sociedade brasileira de uma forma tão ética. Ele não se vale só da estética teatral, ele também se vale da ética. E ele dá voz ao ator”, comenta Jerônimo, que foi convidado por Neves para compartilharem a direção do espetáculo.

A montagem começou a ser desenvolvida em 2014, ao ser contemplada por um projeto de pesquisa do também mineiro Grupo Galpão. E desde que foi encenada pela primeira vez, no início de 2015, vem ganhando novos elementos. “Têm acontecido muitas coisas no Brasil desde 2014. Com relação às opressões das minorias, a gente perdeu a Secretaria de Igualdade Racial, as políticas públicas contra a homofobia recuaram, então, vamos atualizando nesse sentido”, afirma Jerônimo.

O espetáculo dá continuidade ao trabalho do Grupo dos Dez, formado em 2008, na linguagem do teatro musical brasileiro. Todas as canções foram feitas pelo elenco, e há, obviamente, samba, mas também rap. A preparação corporal dos atores foi baseada na capoeira e na dança dos orixás.

Ao longo da trajetória de Madame Satã, o próprio dramaturgo e diretor se viu diante de novas percepções sobre o papel da arte. Para manter a coerência da proposta de conscientização do espetáculo, Jerônimo, após a leitura de um manifesto pela representatividade trans, decidiu não atuar na temporada paulistana e deixou a personagem Primorosa, que denuncia a transfobia na peça, a cargo da atriz transexual Juhlia Santos. O protagonista é interpretado, em momentos diferentes da vida dele, pelos atores Denilson Tourinho, Evandro Nunes e Rodrigo Ferrari.

Jerônimo comemora a coincidência de o projeto estar em cartaz em São Paulo na mesma época da realização da Parada do Orgulho LGBT – ainda que não faça parte da programação oficial do evento. A última apresentação de Madame Satã será no dia 18, data em que ocorre o tradicional desfile na Avenida Paulista.

Madame Satã completa a trilogia afro-mineira do Grupo dos Dez, composta ainda pelos espetáculos Galanga – Chico Rei e Zumbi, que também foram apresentados na Caixa Cultural. O texto da peça deve ser publicado em livro em breve e há uma proposta para ser gravado um CD com as composições do musical. Na estreia, haverá o debate com o tema A Brasilidade nos Corpos e, durante a temporada, ainda serão feitas oficinas sobre o teatro musical brasileiro.

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