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Follies

Riso do maneta fazia barulho no teatro vazio

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José Escarlate

A nossa patota, nos Anos Dourados, tínha uma programação às vezes diferente e inusitada. Na avenida Copacabana, no posto 5 e meio, havia um teatro, chamado Follies, que era do ator e empresário Juan Daniel, pai do hoje também ator e ex diretor da TV Globo, Daniel Filho. Havia alí um naipe de mulheres bonitas, vedetes maravilhosas como Elvira Pagã, as irmãs Marinho, a Nélia Paula, a Carmem Verônica e a Betty Faria. Todas elas de 400 talheres, capazes de enlouquecer frade de pedra. Era um negócio muito sério. Adolescentes, fazíamos ponto na porta do Follies.

O Juan Daniel, gordo, com seu sotaque portenho inconfundível, como o teatro andava a meia bomba, sem público suficiente, quando o espetáculo começava nos colocava para dentro, ocupando as poltronas vazias. Condição: servir de “farol”, aplaudindo as estrelas do show. Lembro bem que o primeiro show que assistimos, foi uma comédia musical com a exuberante Elvira Pagã e o engraçadíssimo Walter D’Ávila. Diz o ditado que, de graça, até injeção na veia. Desfrutávamos a sorte de ainda vermos mulheres lindas, inalcançáveis para nós. Juan Daniel era espanhol de Barcelona. Em Buenos Aires, ingressou no teatro de revistas como bailarino e cantor. De cara pintada imitava o americano Al Jolson. À saída, carrões esperavam pelas estrelas do show na porta do Follies, com destinos ignorados, mas previsíveis.

Uma noite, durante um espetáculo, Juan Daniel circulou pela plateia para checar. Foi quando viu, sentado comodamente em uma das poltronas um maneta que parecia aprovar as piadas do Walter D’Ávila. Falou para o Acrísio, o homem que nos colocava para dentro para aplaudir a peça. Foi duro com ele: “Então, seu Acrísio, eu lhe dou a senha de entrada para o senhor deixar entrar, para aplaudir, até um maneta?” E o Acrísio, sem perder a majestade, responde: “Seu Juan, o segredo do maneta é a gargalhada. É mortal. Do tipo pornográfico”. Só assim o Juan Daniel acalmou.

Tive uma juventude tranquila, sem medo de sair às ruas pelas madrugadas, esperar a saída dos bailes. Naquela época as noites e madrugadas cariocas eram regadas a muita agitação e descontração. O carioca sabia como curtir a noite, antes do “embalo” substituir a “balada”. Tudo era festa, sol de verão, praia, as boates quentes da zona sul. Não fosse pelos bolsos vazios, sem tostão, eu e minha turma nos sentíamos pobres, mas felizes.

PV

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