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Famílias Batista e Bertin

Sócios ocultos da Friboi fritaram uma multa de 4 bilhões

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Alexa Salomão e Josette Goulart

Em 2015, a Receita Federal tinha uma convicção: a Blessed, o misterioso sócio da JBS, teria sido criação da família Bertin para driblar o fisco e não pagar bilhões em impostos no Brasil. A conclusão levou em consideração dois fatos: os Bertin entraram como sócios da JBS em 2009, o mesmo ano em que a Blessed foi criada. A receita redigiu um longo auto de infração, ao qual a reportagem teve acesso à época, e aplicou uma multa de R$ 3 bilhões nos Bertin.

A história é cheia de reviravoltas e detalhes confusos. Pego pela crise de 2008, o grupo Bertin entrou o ano de 2009 com sérios problemas financeiros. A informação na época é que ele corria o risco de quebrar. A saída foi fazer uma “fusão” com os Batista, unindo JBS e Bertin. Na sequência, as relações entre as famílias azedaram. Entraram numa briga judicial, com troca de acusações públicas pela imprensa. O pivô da briga foi justamente a Blessed.

Os detalhes são intricados. A família Bertin entrou na sociedade com os Batista utilizando um fundo, denominado Bertin FIP. Esse fundo tinha dois cotistas, a própria família Bertin e a Blessed.

Ao longo de 2010, as ações que pertenciam aos Bertin foram transferidas para a Blessed, por um valor irrisório: R$ 17 mil. O valor não fazia o menor sentido. Os ativos dos Bertin, por ocasião da fusão foram avaliados em R$ 12 bilhões – só a parte pertencente à família Bertin era de R$ 8,8 bilhões. Os Bertin se disseram roubados e pediam ressarcimento aos Batista. O impasse chegou ao fim quando os Batista compraram a parte dos Bertin, que deixaram a JBS em 2015.

O fundo ganhou outro nome: Pinheiros Fundo de Investimentos. Mas a Blessed permaneceu na estrutura da JBS, como o sócio misterioso.

Multa mantida – O fisco, porém, considerou toda a história muito estranha. Concluiu que o fundo e as operações envolvendo Bertin e Blessed traziam fortes indícios de que serviram para lavagem de dinheiro e evasão fiscal. Na sua análise, a Receita disse que Bertin, com ciência da JBS, havia infringido a lei tributária.

Em abril deste ano, o Carf, Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, concordou com os técnicos de que houve fraudes fiscais no processo de fusão dos frigoríficos JBS e Bertin. Por unanimidade, os integrantes do órgão concordaram que os Bertin deveriam pagar a multa, que em valores atualizados já está em R$ 4 bilhões. A decisão cabe recurso à instância máxima do Carf, a Câmara Superior.

Sócio misterioso – Desde 2009, a JBS tem um sócio misterioso, a empresa Blessed Holdings LLC. Sua sede fica em Delaware, conhecido paraíso fiscal nos Estados Unidos, onde as leis financeiras são mais flexíveis. Com a divulgação das delações dos irmãos Batista, que dizem ter contado tudo à Procuradoria Geral da República, a expectativa é a de que, finalmente, o mistério seria esclarecido. Mas não é o que se vê.

Os documentos divulgados até agora mostram que Joesley e Wesley Batista, acionistas do grupo, apresentaram em suas declarações de imposto de renda que adquiriram, cada qual, 50% das ações da Blessed. Agora, eles são os donos. Mas não há detalhes históricos.

Os documentos referentes à Blessed, anexados à delação, permanecem sob sigilo da Justiça. Não é possível sequer saber se os Batista deram ou não detalhes relevantes sobre quem foi esse sócio oculto.

Uma reportagem publicada em junho de 2014 revelou que a Blessed tinha na época dois acionistas no mínimo esquisitos: seguradoras localizadas em paraísos fiscais. Uma era a US Commonwealth, de Porto Rico; a outra, Lighthouse Capital Insurance Company, nas Ilhas Cayman.

A reportagem, à época, apurou que apesar de terem nomes diferentes e estarem em países distintos, presidente e demais executivos de ambas eram os mesmos. Também identificou que seguradoras do gênero eram uma estrutura comumente utilizada para ocultar patrimônio. Na ponta final, costuma haver um ou mais beneficiários de apólices que não querem ser identificados. O instrumento é legal e utilizado principalmente para a proteção de grandes fortunas.

A JBS, então, tinha como sócios não apenas os Batista, mas também a família Bertin. Se alguém perguntasse “de quem é a Blessed?” para qualquer uma das famílias, nem uma nem outra sabia responder. E não é que a Blessed não tenha relevância. Desde lá é um dos principais acionistas da FB Participações, que tem o controle da JBS.

Lulinha, a lembrança – Naquela onda de especulações sobre quem seria o dono da Blessed, um dos nomes mais cogitados sempre foi o de Fábio Luís da Silva, o Lulinha, filho do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva. Nunca, porém, foi encontrada qualquer prova que pudesse sequer indicar quem seria o sócio oculto.

Há quem diga que os irmãos Batista não falaram nada sobre a Blessed em suas delações. Mas perguntados foram. Wesley, que foi conduzido coercitivamente poucos dias antes da divulgação das delações, pela Operação Bullish, chegou a dizer em depoimento que quem sabia sobre a Blessed era seu irmão Joesley.

Na semana passada, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) perguntou sobre a Blessed. Na quarta-feira, a JBS respondeu que não havia nenhuma mudança no controle. E negou que a companhia tivesse comprado a empresa. Na sexta-feira, já de noite, a empresa informou novamente à CVM que de fato fizera alteração societária. A Blessed permanece alimentando dúvidas e questionamentos. Em nota, a JBS disse que já respondeu a todas as dúvidas da CVM e “segue em seu firme propósito de colaborar com a Justiça brasileira.”

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